quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Listinha de final de ano

Final de ano surgem sempre as listas de 10 mais de qualquer coisa. Dez melhores filmes, 10 melhores liveros, 10 melhores isso e aquilo. Muita coisa entra forçada justamente para completar as 10 escolhas. Mas acho que, para meu gosto, 10 é muita coisa. Assim, vou fazer como Johnny Winter no Second Winter, que gravou músicas suficientes somente para três lados de um LP e o quarto saiu sem nada. Na capa, dentro, bastou justificar dizendo que compor e gravar para completar um álbum duplo seria desonestidade. E a Columbia topou colocar na rua um disco com três lados.
Contada a história, meus 10 melhores CDs de 2011 são somente quatro. E assim mesmo um é relançamento. São eles os dois Black Country Communion, a nova edição do Quadrophenia (The Who) e Guitar Heaven, do Santana. E se tivesse de colocar um no topo da tabela, colocaria o do Who.
Pelo fato de ser uma obra histórica? Não somente por causa disso. As sobras incluídas são fabulosas; estão longe de ser osso para cachorro ao pé da mesa de jantar. A edição dupla que saiu no Brasil é primorosa, embora seja somente parte de uma caixa lançada lá fora. A caixa acho um exagero, mas o CD compilado, não. Fica na medida.
Tem um caderno de fotos tiradas do filme, que também rendeu um álbum duplo. Tudo em preto e branco, e para quem gosta de fotos em preto e branco como eu... já viu. É remasterizado, embora não se perceba assim tanta diferença do LP original. Talvez a sonoridade seja um pouco mais limpa, mas cristalina, o que dá um pequeno ganho. O bonito é que são duas obras complementares, o LP e o CD. Um é o registro de época, em tamanho natural, com direito ao barulho da agulha percorrendo os sulcos. Outro é o som puro, a música em sua plenitude e sem interrupção, adicionada de um material gráfico e sonoro que valoriza o imenso trabalho de estúdio do Who.
O preço nem é proibitivo. Por uns R$ 50,00 você consegue comprar essa edição especial. Uma bobagem: R$ 25,00 cada CD. O prazer dá para ser barato.
Indo adiante, acho que a medalha de prata fica com Santana. Não vou comentar muito o Guitar Heaven por aqui, pois semanas atrás dediquei um post inteiro a ele. Posso dizer, em acréscimo àquilo que já escrevi, que se trata do melhor trabalho do grande guitarrista desde Marathon - que é do final da década de 70. O que veio depois disso foi um pop bem feito, mas pasteurizado, que durou até Freedom. Não fosse Sacred Fire um disco ao vivo (e, portanto, somente de sucessos), diria que da década de 90 para cá Santana fez nada que prestasse.
Redimiu-se, porém, com Guitar Heaven, no qual ele não tem medo de homenagear vários de seus contemporâneos (como Jimmy Page, Ritchie Blackmore, Eric Clapton e Robbie Krieger) ou representantes da geração seguinte, como Angus Young ou Phil Collen. Santana demonstra imensa modéstia ao reconhecer que todos fizeram músicas excelentes e que merecem ser lembrados por parceiros de armas. Somente essa generosidade vale o CD.
Na medalha de bronze coloco o Black Country Communion e seus dois CDs, lançados simultâneamente neste final de ano - o primeiro, porém, é de 2010. Trata-se de um projeto capitaneado fora do palco pelo engenheiro e produtor Kevin Shirley, que ganhou a fama de santo milagreiro ao trabalhar o DVD do Led Zeppelin lançado há poucos anos e, mais recentemente, o Come Taste The Band, último álbum do Deep Purple na década de 70. Mas a lista de trabalhos do rapaz é vasta.
Shirley juntou Glenn Hughes, Joe Bonamassa, Derek Sherinian e Jason Bonham. Com um time desses, o que poderia dar errado? Pois é, deu em parte. O primeiro BCC é somente um bom trabalho, um tanto confuso e com apenas uma música de grande impacto - One Last Soul.
O restante é disperso, a ponto de a banda ressuscitar Medusa, grande hit do Trapeze, e portanto de Hughes. O mega-cantor/baixista disse até que a canção estava no CD porque era uma das prediletas do pai de Jason, John "Bonzo" Bonham. Mas percebe-se que é uma tentativa de fazer do primeiro BCC um trabalho com algum rumo.
Considero o segundo BCC bem superior ao primeiro. Tem um toque mais zeppeliniano, o que não o desmerece. Em muitos momentos percebe-se uma conexão direta com Physical Graffiti, por causa da sonoridade oriental em várias passagens. Além disso, Sherinian entra definitivamente na banda, já que, no primeiro CD, mal é ouvido. Mesmo não sendo um tecladista inesquecível - da envergadura de um Lord, um Wakeman ou de um Emerson -, nota-se que foi chamado a dar opinião em alguns arranjos. BCC 2 finalmente apresenta um quarteto, já que o BCC1 era um trio de quatro.
Os dois discos de Hughes-Bonamassa-Sherinian-Bonham não vão mudar a vida de ninguém, mas são inegavelmente bem produzidos e executados - sobretudo o segundo. E uma junção de músicos de alta categoria não se pode deixar passar despercebida.
Para arrematar essa resenha, colocaria na menção honrosa o relançamento dos discos do Pink Floyd remasterizados e aumentados, em edições de luxo. The Dark Side of the Moon e Wish Were Here são imperdíveis. Considere incluir na lista Meddle, Atom Heart Mother e Animals. Os demais são para fãs de carteirinha.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Últimas reflexões

Não sei dizer se esta será a última postagem do ano. Mas se não for, considerem-a como. É o que de mais profundo vou falar até o dia 31. Se algo escrever mais adiante, em outro post, será sobre música, relógios ou coisas sem qualquer importância.
Esse ano foi hard, duro mesmo. Mas valeu a pena. Dei um passo atrás para dar dois adiante. Poderia ter sido sem dor, mas, quem disse que a gente aprende pelo amor? Nunca. Tem que se levar uma cacetada, cair bem fundo para mudar procedimentos, maneiras de pensar, formas de agir.
Acho que chego ao final de 2011 mais leve e bem-humorado, pretendendo aprender a trafegar numa seara que sempre tratei com desprezo: a da assessoria de imprensa. Achava, com a rotina dura de 25 anos em redações (um pouco mais, se for contar o período de estágio), que assessor de imprensa era uma espécie e come-dorme, que raramente dá ao assessorado a noção da vida que o cerca. Claro, muitos são os que pretendem apenas enxergar uma realidade que de real não tem coisa alguma.
Também comecei a observar a estrutura de governo. Mantenho minha postura crítica, mas acabou aquela ideia errada de que ninguém trabalha e que para cada competente há três incompetentes. Não sou funcionário público (trabalho para uma agência que presta serviço e faz a função de funcionários públicos), mas tem gente que sua a camisa e vira muitas horas de serviço para desengomar o que lhe é incumbido.
Esse arejamento é excelente. Ouvi um grande amigo dizer, do alto (ou debaixo) do seu desprezo, que assessor de imprensa não é profissional de imprensa. Erro, engano, preconceito. Talvez porque se referisse ao trabalho de alguém que conhecia bem de perto, cuja função primordial era vender notinhas insignificantes de jornal ou evitar que coisas de importância relativa saíssem.
Sim, isso passa pela assessoria, mas não são funções pequenas. Aprendi que uma nota bem vendida, numa coluna de peso, tem influência enorme. Ou que uma reportagem que se impediu de publicar tem o efeito de debelar crises.
Desse lado do balcão vi ainda como o jornalista pode ser maldoso, incorreto, desonesto. Matérias e edições forçadas têm o condão de fazer mal e desinformar. Indicam à opinião pública o caminho errado a seguir, atiçam grupelhos interesseiros e ávidos por mais espaço, incendeiam disputas políticas intestinas.
Nem sempre concordei com a postura assumida no combate a esse tipo de "jornalismo" (com todas as aspas possíveis), mas, mesmo nesses momentos, aprendi. Jamais fui bom estrategista e percebi que, apesar da pressão, o desejo de reagir pode levar a um equívoco ainda maior.
Quem acha que assessoria é um eterno jogo na retranca, está enganado. Não sabe nada. Comunicação de governo é difícílimo exatamente porque há uma desconfiança generalizada sobre os dados que são divulgados. O jornalista, um tanto por vezo e outro tanto por arrogância, desacredita. Não é desconfiar, é desacreditar. Acha que é mentira, enganação, cascata. Que no meio daquilo que se pretende passar, tem um percentual alto de inverdade.
Fui e continuo sendo jornalista. E se um dia voltar para uma redação, serei o primeiro a tratar com mais respeito dados e números oficiais, ainda que a tese que venha sendo defendida ao meu redor seja a de derrubar o que está sendo passado.
Prezados: jornalistas têm teorias e fazem de tudo para confirmá-las. Um repórter sai com um sapato número 40 da redação em busca de um pé que se encaixe nele. Se encontrar um que sirva, ótimo, confirmou a tese. Mas se encontrar um de número 45, vai querer colocá-lo dentro daquele calçado de qualquer maneira.
Aí é que está o perigo. A má-fé e a ambição se revelam nesses momentos.
O balanço de 2011 é positivo. Saí da minha zona de conforto, na qual nada de muito interessante estava aprendendo. Dominava a edição, tinha liberdade para fazer aquilo que queria, orientava repórteres, retrabalhava textos... Mais de duas décadas fazendo isso. Caí numa seara completamente diferente, que me obrigou a pensar. Nos primeiros dias foi muito difícil, mas, com as semanas, as coisas se ajeitaram.
Conheci também pessoas competentes, com outras ciências, e delas quis absorver tudo. Não acho que tenha conseguido, mas, ao menos, voltei a ter o gosto pelo conhecimento, pela novidade.
Sempre achei papo-furado essa coisa de que as pessoas gostam de se sentir desafiadas. Não, ninguém gosta. Ninguém dá uma virada na carreira sem ser provocado. Eu tive que dar ou então, percebo hoje, seguia a passos largos para a mediocridade, ao lado de gente "inculta e bela", aqui numa brincadeira com Olavo Bilac. Quantos sabem disso? Bilac?
Espero, sim, um ano menos acidentado em 2012. Tenho esse direito, tenho o direito de ser otimista. Aliás, tenho que ser otimista. Aliás do aliás: me tornei um otimista. Coisas que a gente aprende somente quando toma uma chicotada no lombo.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Que mérito, que nada

O café da manhã de ontem de Dilma com os jornalistas que cobrem o Palácio mostrou que o governo começa a fazer a engenharia reversa. Ou seja, quanto mais um assunto é incômodo, mais se insiste na teoria de que nada será feito resolvê-lo. É o caso de Fernando Pimentel: as provas de que fez tráfico de influência são tão grandes ou maiores que as de Antônio Palocci, mas vai continuar tudo como sempre esteve porque a presidente quer aprender a conviver com a pressão de comandar um governo corrupto.
Isso, claro, é péssimo. Para quem diz que é intolerante com malfeitos, Dilma faz o caminho oposto. Prefere manter uma amizade de 40 anos com uma pessoa acusada (acusada, não; as provas estão surgindo aos borbotões) de corrupção do que se dar ao respeito pelos milhares de eleitores que a colocaram lá. A presidente aprendeu o pior do corporativismo.
A menos que a Dilma seja muito esperta e esteja fazendo a política de deixar cair de podre, Pimentel come as castanhas de Natal e bebe o champanha de Ano Novo em frente ao mar de Copacabana, numa cobetura.
Disse ela que o problema é do ministro e não do governo, uma retórica rastaquera de disfarçar que a mão não pertence ao braço. Não se justifica que outros alcançados em flagrante delito tenham deixado a Esplanada pela porta dos fundos e Pimentel não. É claro que o problema era deles, mas é sobretudo do governo quando mantém no cargo alguém suspeito de tráfico de influência.
Talvez fosse mais honesto Dilma dizer que não quer demitir Pimentel porque são camaradas de longa data, em vez de usar eufemismos ridículos. Que somente reforçam a crescente impressão de que o governo pretende tolerar, sim, alguma parcela de corrupção em nome de velhas amizades.
A presidente também falou da reforma ministerial, afirmando que não vai fazê-la. Já não é de hoje que venho dizendo aqui que tinha dúvida de que algumas pessoas, dadas como demissíveis certos, fossem sacadas do governo.
É o típico caso de não mexer no vespeiro: se removesse nomes e mantivesse o confrade Pimentel, a lógica seria quebrada e haveria revolta entre os partidos atingidos pela troca. Ao dizer que não vai mudar coisa alguma, Dilma abre o guarda-chuva e manda todos ficarem sob ele.
A reforma ia sair, mas surgiu um pimentão (perdão: Pimentel) no caminho. Ninguém comenta um assunto com insistência se não houver uma parcela de verdade. Havia a insatisfação com nomes (embora, nesse processo, tenham sido vários os repórteres que se dedicaram à nobre arte de dar chutes no ar), gestões vinham sendo feitas, figurinhas pedidas e sugeridas.
Até que alguém chegou perto demais da presidente. Enquanto se falava na terceira pessoa, Dilma não esquentava a cabeça. Passou a se preocupar à medida que um ministro que ela mesma tirou do bolso do colete não era a figura ilibada que dizia ser. Parou tudo.
Ela voltou até mesmo a se consultar com Lula, que dias atrás a recomendou que, se tivesse de mexer no time, fosse devagar. Esperasse a manifestação dos que vão sair para disputar eleições muncipais, nomeasse o definitivo ministro do Trabalho e parasse por aí. Nem mesmo Mário Negromonte seria removido. Aqueles contra os quais pesa a acusação de ineficiência (Ana de Hollanda, Afonso Florence) seriam aprovados na recuperação.
Até ministérios que seriam suprimidos e secretarias que caminhavam rumo à extinção continuarão a existir. Por questões de prudência, não seria interessante encurtar espaços que são dos partidos, em pleno ano eleitoral. Usarão entes públicos para se cacifarem e jogarem a máquina nas eleições em favor de si mesmos e dos seus.
Vou além: tais pastas servem para abrigar os enjeitados nas urnas, os companheiros vencidos. É um prêmio de consolação que os ajuda a não perder o controle sobre diretórios e zonais.
Dilma, enfim, é rigorosamente igual a Lula e mostra isso ao distribuir presentes de Natal para quem não marece. A meritocracia que a presidente se farta em exaltar não serve para o governo dela.

Um disco impressionante

Enquanto escuto o estupendo álbum quádruplo do Chicago no Carneggie Hall, o Chicago IV, gravado no começo da década de 70, vou me espantando com a sabedoria musical de jovens que mal haviam passado da faixa dos 20 anos de idade. Ainda que, poucos discos depois, a banda se tornasse num grupo pop de qualidade duvidosa, mas indubitavelmente bom, ouvi-la no começo da carreira fazendo uma música de tamanha complexidade faz pensar na formação musical como ensino sério e formal.
O Chicago (que já tinha deixado de ser Chicago Transit Authority por processo judicial movido pelo Departamento de Trânsito da Windy City, berço do blues elétrico e da Chess Records, e palco das vilanias de um certo Alfonse Capone) acompanhava aquela trilha que misturava rock com jazz, sem fazer jazz-rock ou fusion. O rock estava ali, assim como o blues, mas com uma levada diferente, dissonâncias e aspectos da música orquestral. O Blood, Sweat & Tears de David Clayton-Thomas, Bobby Colomby, Al Kooper e Mike Bloomfield fazia algo semelhante e brilhante o suficiente para durar pouco e entrar para a história.
Voltando ao Chicago. Girando em torno do excelente guitarrista Terry Kath (que, reza a lenda, fez Jimi Hendrix babar na gravata), tinha um trio de metais de tirar o chapeu (James Pankow, trombone; Lee Loughnane, trompete; Walt Parazaider, saxes e flautas), um baixista seguro (Peter Cetera), um baterista de bom nível com feedback de jazz (Danny Seraphine) e um tecladista, compositor e cantor que fazia a diferença (Robert Lamm). Quando se ouve composições como Does anybody really knows what time is?, Questions 68 & 69, Begginings ou 24 or 6 to 5, se percebe uma maturidade impressionante. Ainda que estivessem no conservatório de música desde cedo, a criatividade nos arranjos e a estrutura das canções é invulgar.
Os quatro CDs - na verdade três são o show original e o quarto é de sobras da temporada no Carneggie - dão imenso prazer. Boa parte das canções faz parte do repertório ao vivo do Chicago, que as executa ainda hoje com pequenas alterações. Sinal de que não foi preciso atualizá-las por estarem datadas. Muitas bandas fizeram rearranjos com o intuito de buscar novos públicos, penetrar em faixas etárias menores para segurar público. Esse material do Chicago passou no teste do tempo.
Claro que o CD quadruplo não saiu no Brasil. Vi-o certa vez na Fnac, numa caixa luxuosa, que custava mais de R$ 200. Um exagero evidente, que me fez recorrer à pirataria na internet, mas que por alguma estranha razão não materializei em CD. A versão que ouço está no meu pen drive, em MP3, que com um bom fone de ouvido não omite nada (digo isso para terror dos puristas, que, como puristas, são irracionais).
Mas isso pouco importa.
É um disco impressionante, já que a banda consegue reproduzir exatamente aquilo que fizera em estúdio. Sobretudo quando se pensa que, não muito distante desse trabalho, o Chicago passou a escrever música mais fácil, afastando-se da origem jazzística. Não que os discos que vieram a seguir sejam péssimos (ao contrário), mas, musicalmente, empobreceram.
E não digam que a morte de Terry Kath foi a responsável por essa guinada, pois participou dela. Tampouco se pode atribuir a feição pop à entrada do brasileiríssimo e competentíssimo Laudir de Oliveira na percussão. É evidente sua colocação na banda justamente por causa do acento mais palatável que o Chicago assumiu.
Hoje a banda está na enésima formação, mas girando em torno de Lamm, Pankow, Parazaider e Loughnane. Alguns dos integrantes que vieram depois já estão completando quase 20 anos de grupo (como o baterista Tris Imboden ou o baixista e cantor Jason Scheff) ou 30 (como o cantor, guitarrista e tecladista Bill Champlin). Guitarristas foram vários, desde Donnie Dacus (que substituiu Kath logo após sua morte) a Michael Landau, passando Dawayne Bailey.
Dos integrantes originais, Peter Cetera chegou a fazer bem sucedida carreira-solo por conta da boa aparência e a inconfundível voz de falsete. Danny Seraphine formou uma banda de jazz na California e deixou o circuitão. E Laudir, que entrou no grupo ainda com Kath vivo, se encheu dos compromissos pesados do supergrupo: com a boa aposentadoria à base de direitos autorais, voltou para o Rio, onde toca com quem quer e bem entende. É possível vê-lo nos bares da cidade dando aula de ritmo para a moçada mais nova.
Chicago IV marca o fim da primeira fase da banda, que já taxiava rumo ao estrelato.

De Gravatá para esse Brasilzão

O que move as pessoas para a política? Dinheiro e poder, mais nada. Do tubarão branco ao peixe de aquário, todos querem arrancar um pedaço do erário. Esse negócio de bem-estar do povo é pura conversa fiada, embora, no final das contas, a população precise de representantes para tentar pegar as migalhas do trabalho do Executivo ou do Legislativo.
Para quem discorda do que estou falando, veja o documentário Porta a Porta, de Marcelo Brennand, que está entrando em cartaz. Pelo trailer, não só é imperdível como endossa tudo o que falo aqui. O cineasta acompanhou a disputa pela prefeitura de Gravatá, interior de Pernambuco, em 2008, mais um desses inúmeros municípios no qual o principal empregador é o poder público.
Quer dizer: não tem trabalho. Comércio é coisa de parentes, que envolve a família toda, o mesmo acontecendo com lavoura ou gado. Agências do governo estadual ou federal são compostas por concursados, deslocados para o sertão. Bancos seguem a mesma regra. Então, quem sobra para dar emprego a uma população que não para de crescer? A prefeitura.
E mesmo uma prefeitura pobre tem muito a oferecer. Sem receita, vive pendurada nos repasses dos governos estadual e federal. É um saco sem fundo que não vira escola, posto de saúde, hospital ou asfaltamento. Antes, alguém já meteu no bolso o dinheiro que chega. Todos querem fazer isso, direta ou indiretamente, do prefeito aos secretários, do vereador ao cabo eleitoral.
Não se pode cair na tentação de culpar a pobreza por isso, nem o Nordeste. Isso acontece em todo o País, de Norte a Sul, com prefeituras grandes e minúsculas. O roubo é proporcional ao potencial de arrecadação. Não fosse assim, não se estaria discutindo, no âmbito do Governo Federal, como tornar mais transparente a planilha de gastos das prefeituras. Das grandes ainda se controla, mas, e das pequenas? Gravatá tem um site? Talvez tenha, com informações básicas e nenhum dado sobre a aplicação do dinheiro que entra nos cofres públicos. Se alguém quiser conferir, faça o favor.
O documentário é o retrato da política não somente brasileira, mas terceiro-mundista. O cara para se eleger a um cargo público promete, apenas isso. Quando um cidadão diz que quer ter acesso ao gabinete do prefeito para buscar um remédio lá quando precisar, não está sendo ignorante. Todos, se pudéssemos, faríamos o mesmo, já que crescemos sob uma arraigada cultura assistencialista.
Qual a diferença entre o cabo eleitoral de um candidato em Gravatá e o de Lula? Nenhuma. O que os move é a aposta no mercado futuro do emprego nomeado num cargo público.
Nesse negócio, sinceridade é o que menos importa, convicção não está em jogo e honestidade é artigo em falta. Porta a Porta mostra a ferocidade da política, que em alguns desses locais termina em troca de tiro. Ninguém é bonito, tal como o hoje senador Fernando Collor, braço erguido em desafio quando fez campanha presidencial em Niterói, em 1989. A foto é célebre: rosto contraído, boca de berro; parecia um dos 300 de Esparta, indo para a guerra contra os gregos. Falta-lhe, porém, o argumento da defesa do ideal.
Citei Collor, mas poderia ter citado Lula, lançando chorrilhos de perdigotos naqueles que babam por cada uma de suas palavras, debaixo do palanque. Para eles, o monte de asneiras é uma revelação bíblica.
Gravatá é o Brasil paulista e carioca, da capital. Tem lances engraçados no filme, todos provocados pelos diálogos toscos entre os personagens, o vernáculo sendo marretado sem dó pelo analfabetismo. Ninguém tem medo do ridículo. A falta de dentes é tão frequente quanto a de escrúpulos.
Todos querem sangrar o porco gordo da prefeitura, cravar-lhe a faca rasgando o couro e, com a carne ainda quente e trêmula (nada a ver com Almodóvar), arrancar um naco para saciar a fome. E babando saliva e sangue, rir satisfeito.
Não se enoje com a imagem descrita aqui. Política é bárbara por definição. Há os que a fazem com alguma ética, alguma apenas. Porque quando é preciso abater o adversário, atiram da mesma maneira que aqueles que não têm ética alguma.
Churchill disse que a democracia é o pior dos sistemas políticos, excetuando-se, claro, todos os outros. Gravatá está aí para confirmar.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Cinismo, códigos morais, regências sociais e censura

Leio na coluna da jornalista Eliane Brum,  no site da revista Época, que está circulando pela net um vídeo bizarro: de uma mulher que, em plena agência bancária, defeca, enquanto é filmada (obviamente pelo celular) por outra (ou outro). Não vi o vídeo, nem vou ver. Evidentemente que a mulher que comete o ato de sujar o hall de um local público está fora de si - se permanentemente ou não é outra história. Paira a dúvida sobre a sanidade dessa pessoa. Mas não há qualquer dúvida sobre o cinismo de quem saca um aparelho do bolso e se diverte com a patetice alheia.
Eliane defende que, tanto a mulher que defeca quanto a (ou o) que filma, estão em estado de completa barbárie. Ignoram as regras de convivência em sociedade, atropelam questões morais, embora por razões diferentes. Acho essa questão filosófica demais. Penso que podemos resumir tudo numa pergunta: onde está nossa auto-censura?
Quem não tem auto-censura também está em estado de barbárie. Isso é certo. Mas a net tem estimulado tais coisas. Estamos vivendo a época dos extremos: depois de décadas de repressão, passamos pela fase do vale-tudo. Não há rédeas, não há privacidade. Precisamos achar o quanto antes o ponto de equilíbrio.
Não podemos aceitar a expressões igualmente cínicas, como "vê quem quer" ou "quem procura acha", para justificar esse estado absoluto, quase animal, de liberdade. Censura tornou-se uma palavra maldita, ainda mais nos trópicos. A simples menção desperta reações apaixonadas, esgares de nojo. Mas, o que fazer quando um vídeo de uma mulher defecando numa agência bancária começa a circular na net? Damos as costas e dizemos "vê quem quer"? E nossa responsabilidade?
O "deixar pra lá", a indiferença, é tão bárbara quanto quem caga e quem filma. É igualmente cínica. Temos um compromisso uns com os outros, ainda que não admitamos isso. O site, por dever de ofício, deveria, sim, censurar. Cen-su-rar! Quem perderia se esse vídeo fosse tirado do ar? A liberdade de expressão ou o direito à informação! - dirão os mais exaltados. Que liberdade? Que direito à informação? Desde quando filmar alguém em estado ridículo informa algo? E que liberdade é essa que clama por ver uma mulher desequlibrada entre dejetos?
Não vamos confundir cinismo com liberdade. Não são sequer parecidos os dois conceitos. Quem exibiu, o fez por não saber exatamente o que é compromisso social, embora jamais vá admitir isso - talvez já esteja acostumado com cenas de violência semelhante. Será até capaz dizer que fez um trabalho jornalístico, assim como esses programas que acompanham equipes da polícia em busca de criminosos. Isso não é jornalismo: é curiosidade, mais nada. Jornalismo é muito diferente de mostrar um carro da PM perseguindo bandidos até algemá-los.
Sordidez dá ibope, gera audiência. Quem apresenta programas dessa natureza defende: é jornalismo. Quando confrontado, diz que é liberdade de expressão. E se derrubado mais esse argumento, alega: "vê quem quer".
Voltamos ao marco inicial, o do cinismo e da falta de censura. O vídeo da mulher não vai para a TV pelo mau gosto, mas pode circular livremente pela net. Qual a diferença entre uma e outra, já que as redes se utilizam da rede quando precisam? Talvez seja porque as televisões atingem milhares de lares e a net não. Mas quem disse que códigos morais valem somente para um desses veículos? Não são de comunicação?
E códigos morais não representam alguma espécie de censura, de balizamento? E quem tem menos nesse episódio: a desequilibrada que defeca ou a pessoa que filma, tida como normal?
Pois é.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Do medo à sinistrose

Já faz alguns dias desde meu último post e, se a situação da reforma ministerial mudou (comenta-se que Dilma troca somente os ministros que vão disputar a eleição municipal, mais o novo titular do Trabalho, o que representa que até Mário Negromonte tem chances de ficar), a da Europa vai de mal a pior. Estava zapeando a internet quando me deparei com o artigo de Paul Krugman, que avisa dos riscos de uma guinada à extrema direita se a crise do euro continuar no mesmo diapasão. Leia-se: uma ditadura nos moldes de Hitler, Mussolini, Salazar ou Franco.
Compartilho somente de parte do pessimismo do economista. A direita, seja ela mais moderada ou extremista, jamais desapareceu da Europa. Agora mesmo a Espanha escolheu um governo conservador, já que os conservadores são tidos com controlados e suficientemente corajosos para tomar medidas impopulares. A Itália, depois do vendaval Berlusconi, também tem um governo conservador, sob comando de Mario Monti, que já começa a enfrentar as primeiras resistências por causa do xarope amargo que quer fazer descer goela do povo abaixo.
Esse mesmo conservadorismo é visto na Grécia, no governo do economista Lucas Papademos. O premier belga, Elio di Rupo, que embora tenha origens no partido socialista, tenta fechar uma coalizão com os conservadores. Sarkozy tem uma eleição pela frente na França e, embora esteja atrás do socialista François Hollande na última pesquisa, avançou alguns pontos por causa da participação nas negociações para evitar o naufrágio do euro. A sondagem coloca Marine Le Pen, do abominável Front National, com 17% das intenções de voto.
De alguma forma, a direita vem sendo convocada a dar sua contribuição na busca de uma saída da crise. E é aí que as coisas se enrolam. Não diria que se verá a ascenção de um novo Hitler, mas o discurso racista e discriminatório voltará com força à medida que os conservadores avancem. E terão o endosso dos socialistas, tidos como progressistas, que diante da dimensão do problema terão de aceitar as restrições. Imigrantes de todos os continentes, sobretudo os africanos, os europeus do leste e os muçulmanos de qualquer continente, estarão na lista dos enjeitados preferenciais.
A crise econômica historicamente escolhe bodes expiatórios. Já foram os judeus, como os imigrantes africanos tiveram vez. Depois, os muçulmanos. Ciganos também entraram na dança e foram deportados às carradas da França, meses atrás. Um doido na Noruega saiu atirando em inocentes afirmando que era preciso parar a invasão islâmica. É a velha história de que o imigrante tira o espaço do nativo. A justificativa é idiota e racista, adjetivos, aliás, quase sinônimos.
Mas quem é da terra se recusa a fazer certos serviços, entregues aos que vêm de fora.
Haverá convulsões, sim, mas por razões diferentes. Dos trabalhadores contra o governo, que não vão aceitar reduções de programas sociais e benefícios (como aumento do tempo para se aposentar ou tetos de aposentadoria), por mais anacrônicos que pareçam para uma Europa em crise. Dos trabalhadores contra os trabalhadores imigrantes, que serão acusados de tirar-lhes postos, ignorando que alguns serviços subalternos e insalubres há muito são proibidos por esses mesmos sindicatos de trabalhadores. Dos imigrantes contra o governo, pois não vão aceitar novamente ser bucha de canhão, culpados de uma crise que não construíram. Dos governos contra os governos, pois alguns considerarão (como já consideram) impensável que outro país intervenha na sua economia diretamente, impondo ditames e regras. Da Europa contra Ásia (leia-se China, por mais anacrônico que isso possa parecer), África e América Latina, colocando restrições cada vez mais estúpidas aos produtos que vêm desses continentes, além de impedimento ao trânsito de pessoas.
A tragédia europeia está somente começando, mas a democracia não parece ameaçada. Dessa vez, não há um discurso fácil, capaz de galvanizar uma nação inteira, tampouco oposições fracas e países indiferentes a decisões insensatas. O mundo hoje é um só e a Europa está coladinha na China, ainda que não geograficamente. Eles espirram e nós nos gripamos, coisa que não acontecia na década de 20 ou 30 do século passado, quando a terra era maior e os países mais distantes.
Para sair do atoleiro, os europeus precisam do restante do mundo. Mas a tentação de se fecharem é grande.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Da bobagem ao fato

Entramos entrando na "silly season", a temporada dos bobos. É quando, por falta absoluta de notícias, repórteres e colunistas exercitam a arte do chute. A exemplo da lenda que gira em torno de Zico, que colocava uma camisa no alto do travessão como alvo e cujo perfeccionismo em tentar acertá-la fez dele um exímio cobrador de faltas, muitos acreditam que será assim que vão derrubar ministros e influir nas decisões de governo. Não vão. Para alguém do primeiro escalão cair, a munição tem que ser pesada.
Lupi foi o último, depois de um festival de bravatas e mentiras. Admito que cair agora ou em janeiro, quando haverá a reforma ministerial (única coisa verdadeira nesse universo de chutes a gol), não fazia muita diferença. Já estava ferido de morte, como Mário Negromonte, por enquanto esquecido.
O mais recente a dar entrada na UTI é Fernando Pimentel. Não quer dizer que vá morrer, mas a condição não é das melhores.
A rigor, o titular do MDIC está na mesma situação de Palocci, que desceu do pedestal de primeiro-ministro por consultorias fora de hora. Pimentel também atuou naquele período pré-governo, época em que esteve na campanha de Dilma como um dos coordenadores. Já vimos esse filme em maio: Palocci negou que tivesse havido tráfico de influência até o final, assim como Pimentel está negando. Não funcionou.
* A faxina ética que vem sendo feita pela imprensa (registre-se e ressalve-se: Dilma tem somente atendido à condenação da opinião pública) vai dando imensa munição aos candidatos da oposição a importantes prefeituras. São Paulo é um caso típico: como candidato escolhido pelo PT, Haddad terá dificuldades em se defender contra o ataque adversário. Além do passivo que acumulou à frente do Ministério da Educação, ainda terá de explicar como é fazer parte de um governo que, em 11 meses, demitiu sete ministros, sete deles por envolvimento com corrupção. Não chega a oito porque Negromonte já está com o bilhete azul na mão e sai em janeiro. E não chegará a nove porque o recesso de fim de ano vem aí e Pimentel tem a chance de se manter no cargo. Mas sobrevive em janeiro?
* Esses, porém, são casos claros. Têm os escuros, cuja saída vem sendo pedida não se sabe ao certo por quê. Nessa condição está Ana de Hollanda. Ainda que ela não se ajude muito e dê imensas chances aos seus críticos, do outro lado também atua um time de fascistóides que impressiona pela virulência e falta de conteúdo. Os integrantes dessa charanga se consideram os donos da cultura do país e, como crianças mimadas, acreditam que um governo deve seguir a agenda deles, não a do governo.
Têm conseguido bater bumbo porque a ministra (aliás, não apenas ela, mas todos aqueles que são tidos e havidos como demissíveis por incompetência) optou por uma relação complicada com a imprensa. Disse para um colega que tenho aprendido muito com o mau jornalismo praticado por alguns veículos, que respaldam teses que desenvolvem abrindo espaço para os eternos críticos e insatisfeitos. A balança deles está sempre desregulada e pende para o lado do desejo de fazer onda de qualquer maneira.
* Mal entramos na "silly season". Quando o governo começar a parar, veremos gente chutando com as duas e com as quatro pernas por meio de reportagens sem fontes, repletas de "offs" e com dados requentados, trazidos de matérias que saíram várias vezes nas últimas semanas.
É a  falta de notícia travestida de notícia. Isso só acontece porque o governo é fraco e permissivo. Especulações viram verdades; chutes se tornam fatos. O Palácio deu a pauta. Dilma podia estar preparando, a essa hora, o balanço de 12 meses de gestão, um festival de números que poucos entendem, mas todos engolem. No momento em que divulgar isso, parecerá frio e desprovido de sentido. Porque os jornais já terão colocado na rua uma fileira de lembranças das lambanças (sem jogo de palavras) desse primeiro ano.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Patos mancos

Os comentaristas políticos brasileiros sabem bem o que significa a expressão "lame duck". É o "pato manco", aquele que pode escapar agora da mira do caçador, mas vai morrer logo adiante. Os políticos americanos usam esse jargão como forma de mostrar que fulano não dura muito e que, mais dia, menos dia, vai cair. Pode-se dizer o mesmo de Carlos Lupi.
Fico pensando se tirá-lo agora, como sugeriu a Comissão de Ética, ou daqui a um mês, faz alguma diferença se o cara vai sair mesmo. Creio que, a rigor, não. A reforma ministerial vem aí em janeiro e ele é nome certo para sair na barca dos demitidos. Se não sair, aí é grave, dona Dilma.
Li uma colunista que afirmou tudo isso ser uma imensa palhaçada; que a presidente desautorizou a Comissão. Discordo. A Comissão não fez nada que o Palácio do Planalto não soubesse que faria. Se tivesse liberado o Lupi, achava estranho. O roteiro do ministro está traçado. Passa o Natal e o Ano Novo no cargo por pura brincadeirinha. Até porque, a partir do dia 10, aqui em Brasília, o ritmo é devagar quase parando. Vai tudo funcionar à meia-boca.
Não posso assegurar, mas Lupi deve estar aos poucos limpando as gavetas. E se valer a mesma máxima de Negrão de Lima, tomando cafezinho frio nesse que é seu final de governo. Ali pelo dia 15 segue para o Rio, festeja o final de ano em família e entre amigos e já sabe que não volta. Fará figuração no Ministério até ser comunicado da decisão da presidente. Pelo ritmo de saída, processos importantes já começam a dormitar nas gavetas, esperando a assinatura do próximo titular do Trabalho.
A tal colunista estava indignada. Só passarei a esse estado se a reforma ministerial for transferida para depois do carnaval. Estou indo pelo senso comum de que, em janeiro, as cabeças rolam. Até lá, tem tempo de dona Dilma articular as mexidas que pretende fazer no tabuleiro. Dizem que nem todos os tidos e havidos como demitidos vão sair, mas apenas remanejados de lugar. Até lá, é tempo de sugerir nomes, soltar balões de ensaio para colher as reações e muita, mas muita, especulação.
Tirando a turma que vai se candidatar às prefeituras (Haddad, Iriny), tem o pessoal que foi pego com a boca na botija (Lupi, Negromonte) e o pessoal que não disse a que veio (Ana de Hollanda, Afonso Florence). Em relação aos dois primeiros grupos, percebo que o noticiário os mantêm sob fogo cerrado, mesmo porque as notícias que os envolvem são sólidas. Mas começo a ter dúvida sobre aqueles considerados ineptos.
Lendo ontem um jornalão, numa sub-retranca (para quem não sabe: uma das matérias agregadas à principal), um repórter tratava com muito cuidado a saída de Ana de Hollanda. Colocava vários "se", "pode" e "deve". Não afirmava, não cravava. Dias atrás, o senso geral é de que ela seria uma das primeiras a rodar. Agora, vejo cuidados em relação a esse vaticínio.
Mesmo porque, convenhamos: a ministra tomou muita traulitada, mas foi especialmente feliz quando disse que era a imprensa que a estava tirando, não o Palácio. Não mandou o "Dilma, eu te amo" do estabanado Lupi, mas mostrou que tem intenção de ficar no cargo. E se tem intenção é porque alguém sinalizou que a possibilidade é boa, que tem muito glacê e pouco bolo nas reportagens que estão saindo.
Não existe demissão antecipada, isso é certo. Existe o boato, a conversa à boca miúda, mas aquele negócio de o cara dizer hoje que vai demitir daqui a seis meses é pura balela. É o tipo do negócio que ninguém  anuncia. Ana vai dançar? Tenho minhas dúvidas.
Como se afere a competência quando o assunto é governo? Batendo bumbo? Alardeando os feitos? Mas isso não é marketing? Ah, é justamente o contrário, ficando caladinho e trabalhando em silêncio, igual mineiro? Mas isso não é omissão? Lula conseguiu tal popularidade apenas porque trabalhou ou porque subiu no palanque e berrou seu governo pelo megafone?
Pois é. Nas casas de aposta de Londres, eu botava a mesma quantia na saída e na permanência de alguns nomes tidos como patos mancos.

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Segunda rodada dos bateras

Atendendo ao pedido do meu irmão, que me pede para fazer um segundo tempo sobre os bateras, vou comentar os caras que ele sugere. São fabulosos, evidentemente, mas não diria que compro disco por causa da presença deles. Tenho vários CDs e LPs em que aparecem, mas por mero acaso. Alguns têm até carreira-solo expressiva, com coisas interessantes, mas repetitivas. Ainda assim, vale a pena ouvi-los.

Carmine Appice - O cara já mandava muito no Vanilla Fudge (aliás, vale a pena correr atrás de um disco que gravaram faz uns cinco anos ou mais. Exceto pela presença do Mark Stein, estão no grupo o Tim Boggert e o Vinnie Martell). Depois, continuou "esplanando" (como diz meu camarada Evandro) no Beck, Boggert & Appice, veio o Cactus e mais meio mundo (Ozzy Osbourne, King Kobra, Blue Murder). Aliás, acho o trabalho dele no primeiro disco do Blue Murder impecável. É o típico batera de hard rock dotado de técnica e bom gosto. Não exagera e dá umas baquetadas que fazem a diferença. 
Steve Smith - Ouvi esse cara pela primeira vez no Enigmatic Ocean, do Jean-Luc Ponty. Depois, no Con Proby, do Focus, e quando percebo já estava no Journey. Pegou uma fase ótima da banda, talvez a mais criativa desse que é o expoente máximo do hard farofa (mas muito bem feito). Aí, como ele mesmo disse numa dessas revistas baba-ovos, voltou ao jazz, sua primeira praia. É um senhor batera. Mas muito além dos discos que gravou com Frank Gambale e Stuart Hamm, ainda me impressiona a levada de Don't stop belivin', que abre o Escape (Journey), ou Wingless, do Con Proby.
Dave Weckl - What I might to say... Brilliant, but boring. Todo cara um dia que ser David Weckl, com aquela técnica avassaladora. Mas o problema disso é que chega num ponto que se torna chato. Notas demais, domínio demais. Já disse uma vez sobre o Whitesnake: não discuto que Reb Beach e Doug Aldritch sejam excelentes, mas que saudades de Bernie Marsden e Micky Moody - e como esses dois tocam bem, dentro do que pede a música. Pois é: virtuoses são legais até que a gente acha que são atração de circo. Ouvi David com Chick Corea, com Michel Camilo, em álbum-solo (que são muito bons, desde que não ouvidos com menos de seis meses de diferença) e, confesso, me enchi dele. A bateria soa sempre igual, as composições são sempre parecidas. Entrou em período sabático comigo. Faz tempo que não o ouço. E acho que vai levar um tempo mais.
Simon Phillips - Soube da sua existência pela primeira vez no primeiro disco de Michael Schenker, para o qual Roger Glover reuniu uma cozinha de arrepiar (com Mo Foster no baixo e Don Airey  nos teclados, ou seja, caras com feedback de fusion). Depois, ouvindo o Sin After Sin, do Judas Priest, Simon está lá de novo, arrebentando e preparando o terreno para a entrada de Les Binks nas baquetas. Volto a ouvi-lo numa das faixas de Before I forget, álbum-solo do Jon Lord feito pouco antes de deixar o Whitesnake para voltar ao reencarnado Purple (procurem por Bach onto this). Foi assim, exporadicamente, que eu o ouvia. Até quem um dia encontrei um disco dele, publicado no Brasil, numa dessas lojinhas que a gente entra por desencargo de consciência. Chama-se Symbiosis e é muito bom. Tempos depois, meu irmão me deu um ao vivo dele, igualmente legal. E parei por aí. Não quero cometer o mesmo erro que cometi com outros virtuosos, o de sair comprando tudo que fazem. Você se enche. Tem que ser seletivo.
Dennis Chambers - Caso igual ao de Simon e David. Toca pra cacete. Tenho gravações do cara tocando com Gonzalo Rubalcaba, John McLaughlin, Bireli Lagrene-Dominic diPiazza e por aí vai. Mas o disco que mais gosto dele é o Guitar Heaven, com "don" Carlos Santana. O pau quebra com Raul Rekow e Carl Perazzo nas versões de músicas do Zeppelin, do Purple e até do Def Leppard. Foi lançado agora e é facílimo de achar. Melhor disco do Santana em, pelo menos, 20 anos. Bom para o Dennis, que ainda não entrou para a lista dos caras que tenho de ouvir de ano em ano.
Por fim: li em algum lugar que o Santana fez a cagada de botar a mulher dele, a Cindy Blackman, no lugar do Dennis. Para quem não se lembra, ela era aquela baterista enlouquecida do Lenny Kravitz. Uma bosta fazendo música de merda.
Se ainda fosse a Terri Lynne Carrington, que toca pra cacete, no lugar do Dennis, vá lá. Mas a Cindy é uma tremenda enganadora. Parece o Kenny Aronoff, que distribui muita porrada (e tem uma puta moral). Só que, como quem manda é o maridão, vamos ter que aguentar a Cindy descendo a mão sem muita técnica em três rides K Zildjian (18, 20 e 22 - nem na medida ela é original) e espancando uma daquelas Gretsch que é sonho de consumo de muito batera.
Kiko Freitas - É só ouvir o Obrigado, gente, do João Bosco, ou assistir ao DVD do mesmo show. Manda muito, apesar da cara de professor de Física de colégio secundário. Na banda com Ney Conceição e Marçazinho, ele arrepia. Tem trabalhos-solo que ainda não tive a sorte de ouvir. Mas colocaria Kiko no rol dos grandes bateras contemporâneos de jazz. 

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Meus 10 mais

Adoro essas listas de 10 mais. Há quem diga que faça análises para justificar seus escolhidos, mas não creio que seja nada disso. As coisas se baseiam em gosto, puro e simples. Sobre discos, por exemplo: há quem diga que pegou tal LP porque foi influente, porque mudou isso ou aquilo. Acho a maior conversa fiada. Pegou porque gosta, ora. Mas confessar isso é complicado.
Poucos sabem que toco bateria. Tenho na minha casa um instrumento profissional, daqueles que muitos que vivem da música talvez gostassem de ter. Montei-o ao longo dos anos e considero que, agora, estou com o kit ideal. Não vale à pena descrevê-lo, mas entro nesse assunto para fazer minha lista dos 10 maiores bateristas de todos os tempos.
Não vai aqui qualquer daquelas cascatas sobre influência sobre os demais, importância para a música etc. Entra aqui o gosto, a impressão de tê-los ouvido pela primeira vez, o quanto tenho deles na minha coleção de discos, seja em LP ou em CD. É pura "gostologia". Se fizerem parte de outras listas de 10 mais baseadas em profundas análises, em estudos musiciais e antropológicos, para mim pouco importa - é mera coincidência. Minha escolha é por predileção, nada mais.
Mesmo porque, esse blog é meu e ponho aqui quem eu quiser. Em tempo: a ordem não quer dizer que fulano é primeiro e sicrano é último. São apenas 10 nomes e pouco importa a posição deles no ranking, que, nesse caso aqui, não existe.

John Bonham - Ouvi-o pela primeira vez no Presence, meu primeiro de todos os discos e um dos últimos do Led Zeppelin. Nem preciso ficar versando aqui sobre a técnica do cara. Não acho, porém, que seus solos sejam de tirar o chapéu, mas, no conjunto da banda, é insubstituível. Gosto imensamente do seu trabalho de estúdio e, principalmente, sua criatividade. O fato de tocar alto tornou-se uma marca porque simplesmente a bateria era muitíssimo bem equalizada.

Ian Paice - O que me chamou a atenção desse cara é que comecei a tocar bateria por causa dele. Seu solo no Made in Europe continua sendo, para mim, grandioso e me levou ao curso. Paicey constumava se superar nas apresentações, pois no estúdio, para mim, avaliando hoje e desapaixonadamente, era correto. Nada muito avançado, embora de extremo bom gosto e apurada técnica. Tendo a achar que, nos últimos anos, tornou-se preguiçoso, perdendo boa parte daquela exuberância dos primeiros tempos do Deep Purple. Não vejo sua passagem pelo Whitesnake ou com Gary Moore como pontos altos, tampouco com essa encarnação mais recente do Purple.

Tommy Aldridge - Foi o cara que influênciou 10 entre 10 bateristas que se metem a tocar com os dois pés. Seu trabalho com dois bumbos é insuperável até hoje. Seus solos são formidáveis, espetaculares. Desde os tempos do Black Oak Arkansas sua forma de tocar chama a atenção. Foi ouvindo-o que aprendi a "matar", no tempo e no tempo adiantado, o som do prato. Tenho um show gravado com a banda em que eu tocava (meu irmão foi o cinegrafista) em que uso e abuso desse recurso. Não é nada tão difícil, mas impressiona. Quanto mais não seja, porque é algo que poucos utilizam.

Billy Cobham - Quando ouvi Spectrum, seu primeiro álbum-solo, pela primeira vez, o que me impressionou é que o cara transita na linguagem do jazz e do rock com a mesma facilidade. Também foi o primeiro cara que vi tocando "aberto", ou seja, os pés na posição de destro e os braços, na de canhoto. Prova que começou como auto-didata, aproveitando a posição que lhe parecia mais fácil. Foi o primeiro batera também que vi compondo. Seus discos, vários, comprovam que percussão não é algo menor. Além disso, me impressionou pelos solos, sempre abertos e variados, utilizando todos os (vários) elementos do seu instrumento.

Neil Peart - Comecei com esse cara ouvindo o 2112, que arrebentou no Brasil. Foi o primeiro disco do Rush com o qual tive contato. Depois, na casa do meu camarada Velório (já falei dele aqui), conheci os demais. Muita gente falava de Carl Palmer, mas acho Neil, desses bateras que "vestem" a bateria, o mais impressionante de todos. Pela técnica, pelo bom gosto, por ser o responsável direto pelas mudanças do Rush de disco para disco. Imaginem se o batera ainda fosse o John  Rutsey, do primeiro disco? A banda não tinha ido tão longe. Além disso, se você escuta caras como Mike Portnoy ou Vinnie Paul, escuta por causa de Neil.

Tony Williams - Esse entrou na minha vida quando eu já estava mais maduro. Quando escutei suas conduções com Miles Davis, disse: esse cara quebra tudo. Simplesmente não seguem um padrão normal. Tony conjuga tão maravilhosamente bem todos os elementos com uma bateria mínima, que a gente chega a ter inveja dele. Gravou poucos discos-solos, todos de ótima categoria. Brinca com o jazz e com o rock com tranquilidade semelhante a de Billy Cobhan, mas acho que, na primeira seara, Tony está além, enquanto Billy fica num patamar acima na segunda. Além disso, Tony não tinha medo de descer a mão, ouvir pratos e tambores em toda sua exuberância. Técnica é muito legal, mas paixão pelo instrumento é mais bonito ainda.

Buddy Rich - É um verdadeiro motor de big-bands. Não chega a ser um condutor criativo, que se afasta do convencional, mas, quando entra no solo, aí temos que prestar atenção. Seu domínio do instrumento é simplesmente perfeito. Sabe exatamente onde cada tambor ou prato está; não dá uma única baquetada nos aros ou chega nos pratos erradamente. Impressionante. Tenho vários dos seus discos-solo, pilotando grandes bandas. Acho que passou por um período de menosprezo porque os críticos e entendidos achavam que somente os bateristas negros eram grandes. Imensa bobagem; Buddy tem um disco com Max Roach que mostra que esse torço de cor é uma monumental idiotice. E se caras como Elvin Jones, Philly Joe Jones, Max, Gene Krupa, Shelly Manne, Jack DeJohnette, Roy Brooks e outros monstros do jazz não entram aqui, é porque considero que Buddy os representa com maestria.

Deen Castronovo - É, para mim, o discípulo mais aplicado de Tommy Aldridge. É rápido, tem uma técnica brutal, toca maravilhosamente com dois bumbos e vai nas mais distintas direções. É capaz de ser pesado com Marty Friedman e o GZR, e chegar ao heavy pop do Bad English e do Journey com a mesma tranquilidade.

Cozy Powell - Ouvi esse cara pela primeira vez na mostruosa abertura de Stargazer, do Rising, segundo álbum do Rainbow. Impressionante aquela combinação de caixa com os dois bumbos, que até hoje tento imitar e não consigo (pelo menos com a mesma perfeição). Quando deixou a companhia de Ritchie Blackmore, todos pareceram tê-lo descoberto. Está no primeiro disco de Robert Plant, Pictures at eleven, e rolou até o papo de que entraria na vaga deixada por John Bonham, no Zeppelin. Depois tocou com Michael Schenker, Black Sabbath, Gary Moore, Greg Lake & Keith Emerson, Whitesnake... A lista é imensa e prova como Cozy foi um dos maiores bateristas "on demand" dos anos 80/90, no rock. Antes disso tudo, fizera dois excelentes discos com o Jeff Beck Group. Morreu bestamente, por causa da paixão que tinha pela velocidade. Impressionava também seu kit de bateria, com aqueles bumbões de 26 polegadas, fosse com a Ludwig ou com a Yamaha. Um dos caras de que mais gosto.

David Garibaldi - Soul music é com ele. Claro que ele escutou tudo de Jabbo Sparks ou Ziggy Modeliste, da banda de James Brown, mas David elevou isso à 10ª potência. Os arranjos da Tower of Power são verdadeiros desafios, cumpridos por ele com uma precisão que parece serem fáceis aquelas paradas, pausas, atrasadas ou adiantadas no ritmo. O toque seco de David, com filigranas que deixam clara sua imensa técnica, é como peça de fina relojoaria.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Da conservação das coisas

Já disse aqui, não sei quando, que na viagem que fiz à Suíça, ano passado, um parafuso caiu da minha cabeça. Antes de sair daqui, contei ao meu compadre Jorge Eduardo que, se desse, traria um relógio "nacional". Uma noite, depois de um jantar em Basiléia, andando nas proximidades do hotel, encontrei um antiquário de relógios. Me esquematizei para, no dia seguinte, trazer de lá um exemplar. Tudo deu certo e foi o que fiz.
Fui com um e voltei de lá com três exemplares. O terceiro, comprei no freeshop de Munique. Nada tão espetacular assim: dois Tissot, um comprado em Basiléia, outro na Alemanha. Ainda tenho ambos; o relógio que fui, dei para meu irmão - é um honestíssimo Orient.
Pois desde então, eu e meu irmão temos trocado figurinhas sobre relógios. Dei para ele mais dois (um Rado modelo President, suíço [bela marca, diga-se]; e um Festina, modelo Multifunction, alemão de máquina japonesa, que comprei zero bala na Vivara), que hoje já tem uma coleção tão boa quanto a minha. Mas, é claro, temos nossos sonhos. E é gostoso falar sobre isso.
Ele ficou fissurado pelos Omega Railmaster, modelo que, hoje, é difícil de encontrar. Não é barato e alguns chegam a preços exorbitantes. Para quem não conhece, seu rival direto é o Rolex Milgauss, igualmente difícil de achar e, claro, caro (Rolex barato não existe). Hoje mesmo, trocando e-mails, me falou sobre o Omega Ranchero, fabricado durante dois anos apenas, na década de 50. Achei que ele tivesse encontrado um na bacia das almas e fiquei exultante. Não foi dessa vez. Pena...
Falou-me sobre um Omega Seamaster que viu, numa dessas relojoarias meia-boca em Belo Horizonte, onde mora. O estado não deve ser dos melhores, considerando-se o fato de que a tampa traseira não é original (pertenceu a um Technos que deve ter sido canibalizado). Mas como um Omega é sempre um Omega e o preço que o cara pedia era uma bobagem, recomendei-lhe que pegasse. Antes, dei umas dicas para ver se vale à pena. Recuperar bem um relógios desses sempre tem algum custo.
Meu irmão é um fuçador nato. Já correu tudo quanto é feirinha em BH atrás de coisas antigas. Achou um senhor que ajudou-o a devolver vida a duas canetas Parker 51 que tinham sido do meu pai. Muito legal saber que tem gente que curte essas coisas. Em São Paulo, tempos atrás, no shopping Bourbom, vi uma feira de canetas antigas. Estava no final quando cheguei, mas tinha belos exemplares. Alguma coisa está mudando no Brasil.
Parece que estamos começando a dar valor a artigos de excelente qualidade que chegavam aqui, há mais de 40 anos. Tudo bem, simbolizam a nossa ausência de industrialização, mas, depois da II Guerra, quem tinha realmente indústria pujante? O Brasil estava começando apenas a caminhada e, como carros e outros artefatos industrializados, tudo vinha de fora. Canetas e relógios, por exemplo.
Quando o padrinho da minha primeira mulher morreu, o fundo da gaveta dele estava repleto de relógios. Fora ourives e, pelo jeito, aqueles exemplares ficaram com ele para conserto e jamais foram devolvidos aos seus donos, por esquecimento dos dois lados. Entre eles, um Rolex (não saberia dizer o modelo, que nunca mais vi, mas creio ser da década de 50), um Jaeger LeCoultre (a corda, do final dos anos 40, que tenho até hoje e funciona perfeitamente), um Cyma (que nunca mais vi, mas lembro que o fundo era preto), um Eterna Matic (modelo Kontiki, todo em aço, com a máquina estragada pela ferrugem; o antigo dono deve ter ido à praia ou à piscina, a vedação não estava legal e mandou tudo para o saco) e um Seiko, que está na recuperação e - não sabia - vem da década de 60 - pensei sempre que era dos anos 70.
Dei minhas bolas fora também. Perdi um jogo de lapiseira e caneta que foram do meu avô paterno, para chateação do meu pai. Era uma lapiseira Pelican e uma caneta de pena da Parker. Junto, tinha uma Cross de ouro, que fora do meu pai. Vejam meu prejuízo. Tentei deixar o velho menos chateado dando de Natal, ano passado, uma Waterman. Sei que uma coisa não compensa outra, nem era essa a intenção, mas fiquei muito envergonhado com meu desleixo.
Dei para meu sogro um Eterna Matic que comprei no Mercado Livre justamente no dia em que ele me disse que o relógio que tinha havia estragado. Vejam que ironia. Hoje, não tira do pulso. Seu Azor não é a figura mais cuidadosa do mundo, mas acho legal ver aquele Eterna de quase 50 anos funcionando perfeitamente no pulso dele. É isso aí, quanto mais usa, mais funciona.
Enfim, por que estou contando tudo isso? Porque os objetos têm história. Pode não ser a nossa, mas chegaram até nós de algum jeito, estranho ou não. Isso é que é legal. E conservar coisas assim não tem preço.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Ministro com prazo de validade

A reforma ministerial é inevitável. Não apenas porque o governo a quer, mas porque as especulações em torno dos nomes que saem fizeram dela um fato concreto. Hoje é questão consumada, ainda que Dilma pretendesse fazer as trocas no varejo, dependendo de cada caso. Os ministros que sairão por ineficiência (Afonso Florence e Ana de Hollanda) tinham alguma chance de ficar caso tivessem mostrado mais vontade para isso. Outros vão sair porque buscarão outros cargos (são casos claros de disputa de prefeitura os de Iriny Lopes [Vitória], Fernando Bezerra Coelho [Recife] e Fernando Haddad [São Paulo]), são escândalos em potencial (Carlos Lupi e Mario Negromonte) ou desaparecerão porque suas pastas também sumirão (Luísa de Bairros e Luís Sérgio [que também vai aproveitar o bilhete azul para disputar a Prefeitura de Angra dos Reis, sua base eleitoral]).
Mas essas trocas embutem uma gravidade. Se os ministros deixados ou indicados por Lula caíram por envolvimento em casos cabeludos de corrupção, os que foram trazidos ou aceitos por Dilma são rigorosamente incompetentes. Ana, Florence, Sérgio ou Negromonte não disseram a que vieram. Desses, o único que destoa é Negromonte, contra o qual pesa, além da ineficácia, o fato de ter sido flagrado turbinando a empresa da mulher no contrato de uma prefeitura sob sua influência.
Os otimistas dizem que, agora, vem mesmo o ministério de Dilma. Podemos sentar e esperar por uma tragédia. Pela razão simples de que, aqueles que herdou, tendo gostado ou não, receberam dela o endosso para continuar. Os que vieram depois, ela não conseguiu resistir à pressão do jogo político-partidário. Bobo é quem acredita que, na reforma ministerial, a presidente vai decidir de maneira diferente.
Bem, mas ela vai ter tempo de escolher com calma dessa vez. E não teve da vez anterior? Teve, claro. Tirando um ou outro para o qual torceu o nariz (como Lupi ou o ex-ministro Orlando Silva), o restante ela aceitou sem pensar muito a respeito. Fosse farinha de outro saco, tinha agradecido as indicações e as recusado. Mas...
A história brasileira tem esse hábito: a de trocar nomes como se fosse um jogo de futebol, no qual o intervalo serve para o técnico ajustar a equipe para o segundo tempo com novas caras. Se o mandato de Dilma fosse um jogo de futebol, ela estaria na metade do primeiro tempo, ali pelos 22 minutos. Convenhamos que mudar o time pouco depois que a partida começou é sinal de que estava escalado errado desde o começo. Os treinadores não passam recibo e, mesmo que estejam perdendo, levam os 11 iniciais até o final, tendo apenas o cuidado de jogar fechado para que a derrota não aumente. Já a presidente vai fazer a troca porque percebeu que a equipe é fraca e problemática. Culpa de quem?
Dela mesma. Não estranharia se, em janeiro-fevereiro de 2013, ela novamente mudasse a composição do ministério. Suprimir pastas e criar outras é algo que poderia ter feito na transição. Da mesma forma, ter um cuidado maior com os nomes. Porque se continuar a acomodar, como tem feito, interesses partidários, a imagem de gestora competente e rigorosa tende a se enfraquecer, como, aliás, já vem acontecendo.
As eleições municipais de 2012, de certa forma, vão crivar a percepção que o eleitor tem de Dilma e de seu governo. Porque não é possível que um governo tenha ministros com prazo de validade de um ano. Isso quando não começam a apodrecer antes e precisam ser jogados no lixo.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Uma joelhada no saco

De vez em quando, me arrisco a falar sobre música. Acho que falo com alguma propriedade porque, com o tanto de CDs e LPs que tenho em casa, devo ter aprendido alguma coisa.
Tempos atrás, fuçando na internet, cheguei ao Joelho de Porco. Minha infância me remeteu a um gordão pintado, que aparecia como principal vocalista, numa música que começava com assim: "Atchim, atchim!" Era "Rapé", que abria um disco que o JdP lançara pela Som Livre. Era apresentado como a primeira banda "punk" do Brasil.
Jamais tive esse disco, mas logo descobri que algumas daquelas músicas do JdP, que eu tinha ouvido na falecida Eldo Pop, não pertenciam a esse LP. Nem o gordão era o mesmo: o pintado, era um argentino, o Billy Bond, que jamais foi grande coisa cantando. Eu queria ouvir o outro, que só conheceria num festival da Globo, nos anos 80, voz principal na música "A última voz do Brasil". Esse cantava pra cacete.
Próspero Albanese. O nome, quando ouvi pela primeira vez, me fez pensar: quem se chamaria Próspero Albanese? Com o tempo, fui vendo que devia ser filho de uma dessas tradicionais famílias paulistanas, de origem italiana. Era, aliás, o disco de Próspero que eu queria ouvir.
E o disco chama-se "São Paulo 1554-Hoje". Espetacular. Baixei na internet (lamento confessar, mas se existe uma edição oficial, me avisem para comprá-la). Tem várias faixas que eu acho formidáveis: "Cruzei meus braços... fui um palhaço", "Aeroporto de Congonhas", "São Paulo by day", "A lâmpada de Edison" e mais algumas. Rocks bem pesados, com orquestrações à Deep Purple, com toques ainda de progressivos como Genesis ou Jethro Tull. A banda gira em torno de Albanese, que, não sei dizer (não tenho a ficha técnica), acho que acumula o cargo de baterista nessa gravação. Alguns vocais são de Tico Terpins, que entrava mais como força criativa do que musical.
A capa é ótima, do sumido artista plástico Juarez Machado. Preto e branco com aquele traço inconfundível. Já vi a contracapa, que traz ficha técnica e o escambau, mas não sei dizer quais são os músicos que fazem parte da empreitada. É uma pena que Charles Gavin não tenha trazido de volta esse LPs à luz do sol. Ou se tentou trazer e não conseguiu, é mais triste ainda.
Digo isso porque foi trilha sonora da minha pré-adolescência, quando, antes de dormir, colocava um radinho Sharp de pilha perto do travesseiro e, plugado com um "egoísta" (aquele monofone de ouvido), sintonizava na Eldo Pop. Entre coisas que jamais saberei o que são, pois a rádio era somente música, sem locutor - impressionante como deixou viúvos e viúvas ainda hoje -, e outras que já descobri, ouvi aqueles caras cantando em português, com um inconfundível sotaque paulistano.
"No aeroporrrrrto de Congonhas/ Passa todos os domingosssss/ Só prrrra ver avião descendo/ Só prrrrrra ver avião subiiiiindo...", e o pau quebrava num instrumental ótimo, com uma pegava ganchuda, que sempre me levou a pensar por que o Brasil não teve mais bandas de rock pesado nos anos 70. Vão dizer que os amplificadores Tremendão, as baterias Pinguim, os pratos Ziltanan e as guitarras Gianinni e Phelpas não ajudavam. É, pode ser.
Quem tiver a chance de ouvir "São Paulo 1554-Hoje", ouvirá um grande disco de rock. De rock pesado, hardão (com alguns desvios, é verdade) e que ainda hoje merece ser escutado. Não ficou datado, como muita gente pode pensar. É a expressão mais clara, para mim, do rock paulistano, assim como Adoniram Barbosa, Paulo Vanzolini e Germano Matias foram os ícones do samba da terra dos edifícios do Banespa, Ester e Copan. 

A careta é para você, babaca

O título remete ao site do Globo, que abro e vejo a foto de um sujeito fazendo careta para a câmara do fotógrafo depois de ter sido devidamente levado em cana. Já na caçapa, algemado, mostra a língua e arregala os olhos, doidão que devia estar de cocaína. Sóbrio ou não, vai entrar para a história da cidade como a face do deboche.
Ele não está debochando de mim, um fluminense (nasci em Niterói e faço questão de deixar claro isso; fluminense é uma coisa, carioca é outra), mas dos cariocas malandros, espertos, que apóiam de alguma forma o tráfico, seja como sócios-consumidores, seja pela leniência. Nélson Rodrigues, para sacanear Dom Hélder Câmara, inventou a figura do "padre de passeata". (Como ele era conservador assumido, direitista empedernido, não admitia que religião e política se unissem na esquerda contra a ditadura militar.) Pois eu invento outra figura: o carioca de passeata.
É aquele que sai às ruas para protestar depois de a porta ter sido arrobanda e sobrearrombada inúmeras vezes. É aquele cara que cheira esportivamente ou dá seus tapinhas no baseado por mera convenção social, mas que não acha que está contribuindo com o tráfico. É aquele cara que tem um "amigo de um amigo" que já comprou um carro roubado, mas não fez coisa alguma - nem se indignou. Foram todos tomar um chope gelado no Bracarense, rindo da vida.
Só quem sai do Rio vê o quanto o carioca/fluminense é malfalado. É tido como indolente, leniente e pernóstico. Se você percorrer o Brasil buscando uma classificação para o carioca/fluminense, vai confirmar estereótipos que, por mais que passe o tempo, não mudam: o paulista é trabalhador (qualificado), o nordestino é trabalhador (desqualificado), o gaúcho/catarinense/paranaense é racista e o carioca/fluminense... vagabundo! Hugo Carvana, quando fez o filme, no comecinho da década de 70 ("Vai trabalhar vagabundo!"), jamais imaginaria que contribuiria para consolidar uma imagem - a do sujeito que não faz nada, que ganha a vida com expedientes, mas é boa gente, simpaticão e inofensivo.
Esse é o carioca (sem fluminense, pois tem desprezo pelo nascido em Niterói) até hoje, que não percebeu que a capital do Brasil mudou de lugar há 51 anos. Não há mais razão para manter a empáfia e acreditar numa falsa integração social, de morros e asfalto. Jamais houve essa integração, falácia de intectuais supostamente progressistas, que retrataram a favela, mas nunca fizeram coisa alguma concreta para levar dignidade ao morro. A poesia, no papel, nas telas e no teatro, é linda sempre, mas na vida real...
Foi a favela que se livrou da favela, não a Zona Sul intelectualizada e paternalista. Foi a favela que se levantou, que cansou de esperar, que quis dar um fim nos bandidos sem e com farda. Foi a favela que cansou do estigma de lugar de marginal e de desocupado. Não foi a Zona Sul do banquinho e do violão, dos saraus na sala de Nara Leão com Cartola e João do Vale. Foi a favela que cansou de tomar borrachada no lombo e ver seus filhos levando tapas na cara, porque o filho branco das classes média e alta molha a mão do policial e sai andando como se nada tivesse havido.
Ontem mesmo, uma porção de gente saiu às ruas contra a redivisão dos royalties do petróleo. Rio e Espírito Santo querem que as coisas fiquem como estão e os demais estados, se contemplados, recebam uma parcela mínima, que reduziria a da União. Mas essa porção de gente, que foi mobilizada por TVs e jornais, por insistentes pedidos do governador do estado, não parou para pensar no seguinte: o que tem sido feito dessa dinheirama toda? Onde o governo tem aplicado, que não vejo? Onde as prefeituras, que reclamam que vão à falência, têm investido? Em saúde, em segurança, em saneamento, em educação, em urbanismo? E o governador? Passa tempo suficiente no estado, resolvendo os problemas?
Não adianta sugerir um raciocínio mais elaborado do que esse. As pessoas querem ver as coisas funcionando: o asfalto liso, o calçamento perfeito, o jardim conservado, o esgoto canalizado, a água farta, a luz constante, a escola de boa qualidade, o posto de saúde funcionando, o pronto-socorro atendendo direito, a polícia bem treinada, a segurança de pegar um ônibus e não ter de esconder cordões, carteiras e relógios. Pagam impostos para isso e querem que o dinheiro dos royalties seja investido assim.
O restante é papo de carioca malandro, que fala chiando o "S" e não necessariamente é Flamengo e tem uma nega chamada Teresa.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Para quem é, está de bom tamanho

Carlos Lupi é o típico caso de um inepto que virou ministro. Convenhamos que o fato de vir de baixo (foi jornaleiro e todos sabem disso) não tem nada a ver com o peixe. É inepto porque sempre foi um político obscuro que, de uma hora para outra, ganhou de presente um partido e, ao subir para base de apoio do governo, um ministério.
Leonel Brizola não fez o PDT para a posteridade; fez para ele. Depois da volta ao Brasil, disputou com Ivete Vargas a sigla PTB, pois queria levantar o estandarte de Getúlio e do trabalhismo. A identificação de Brizola com o velho caudilho começava no fato de que eram gaúchos e tinham, de certa forma, a mesma origem política: um fundou o partido para ser sua correia de transmissão no Legislativo; o outro fez a carreira política dentro da legenda, dividindo com Jango o protagonismo depois do tiro que marcou a história.
Ao perder a sigla para Ivete, Brizola fundou um partido à sua imagem e semelhança - embora, se fosse o PTB, seria a mesma coisa. Tinha figuras respeitáveis, como Darcy Ribeiro, Saturnino Braga e Neiva Moreira, com outras que representavam a política de rapinagem. No Rio, conseguia juntar figuras tão díspares quanto o jornalista Sebastião Nery, o cantor Agnaldo Timóteo ou o índio Juruna, com Cláudio Moacir, Paulo Rattes e Brandão Monteiro. Teve até Anthony Garotinho, embora noutra época. Não se podia dizer que tinha um cara de esquerda, tal como o PT daqueles tempos. Centro-esquerda talvez, embora ligado à Internacional Socialista.
O PDT, porém, foi definhando por causa do personalismo de Brizola. Não admitia que alguém o contestasse, ameaçasse sua liderança, riscasse seu protagonismo. Aos poucos, os bons foram saindo, outros foram morrendo e, depois do segundo governo no Rio, a importância reduziu-se ainda mais. No final, o PDT era somente Brizola, com uma representação legislativa fraca e um enorme guarda-chuva para políticos oportunistas, que puxavam caminhões de votos, mas não tinham convicção alguma. Tampouco controle.
No processo de decadência é que entra Lupi. Lá pelas tantas é alçado ao cargo de vice-presidente do PDT, algo que, com Brizola vivo, era quase nada. Mas Brizola morreu. O PDT, que tinha tudo para definhar e ser engolido por uma legenda maior, foi aceitando figuras de caráter político duvidoso. Renasceu capenga, se reagrupou e Lupi teve ao menos a habilidade de não deixar a legenda ser tragada ou tornar-se uma força menor. Só que não escapou de torná-la de aluguel. Vá lá que tenha sido em nome da sobrevivência.
Ainda que os fins justifiquem os meios, o PDT foi chamado para o arco de alianças de Lula porque, ao ex-presidente, interessava isolar PSDB e DEM do outro lado da quadra. A arquitetura feita por José Dirceu foi de um pragmatismo tão hábil quanto assustador: para um projeto de poder de várias décadas, era preciso trazer para baixo do guarda-chuva petista não apenas a esquerda, radical ou não, mas o centro e, se possível, a direita. Acabaram ficando de fora somente os extremos, embora muitos tucanos e democratas tenham sonhado com a possibilidade de embarcar nesse imenso trem do governo.
O Ministério do Trabalho já foi uma pasta de articulação. Mesmo na época em que se juntou com a Previdência, tinha peso político expressivo. Foi sendo esvaziado, diminuído e hoje sobrevive porque faz parte das chamadas "pastas tradicionais" - como Saúde ou Justiça.
Por ter uma certa capilaridade nos estados, ao PDT coube um ministério proporcional à sua importância. E Lupi, que desde a morte de Brizola vinha no comando da legenda, foi aquinhoado. 
É o resumo dessa ópera.
Vocês concordam que Lupi foi até longe demais?

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

É preciso apontar os boçais

Já fui estudante, já fui universitário. Passaram-se pelo menos 30 anos que estou longe dos bancos escolares. Naqueles tempos de juventude, fiz, sim, muita bobagem, algumas das quais me arrependo. Não vou fazer aqui apologia dos erros que cometi, vários deles cometidos deliberadamente. Quero transportar as imagens daqueles tempos para agora, quando vejo essa turma que invadiu prédios na USP se dizer revolucionária, reprimida e outras besteiras do gênero.
Nunca tomei tapa da polícia, mas admito que também jamais dei motivos para isso. A única vez que estive numa delegacia foi quando os bandidos tomaram meu carro, em Niterói, e espero que tenha sido a última. Não tenho uma natureza tão audaciosa assim, mas sempre tive opiniões próprias, mesmo que elas ferissem o senso comum. E nos tempos de escola e de faculdade me fartei de externá-las.
Daí porque acho intolerável o que os estudantes da USP fizeram, assim como já critiquei as invasões e greves na UnB. Acho uma calhordice, uma cretinice, essa associação de futuros sindicalistas com sindicalistas atuais, cuja única intenção é a de desestabilizar a reitoria.
Li que o reitor José Grandino Rodas foi criticado por assinar um convênio com a PM para patrulhar o campus, que não se chama cidade universitária à toa. Com índices de violência assustadores (roubos, estupros e até assassinato), convenhamos que é uma medida coerente.
Não vou defender o reitor, que tem advogados melhores que eu, mas se eu tivesse no lugar dele faria a mesma coisa. Lá vou eu me importar com uma pequena turma que fuma maconha, de estudantes profissionais/futuros sindicalistas, que não quer que os meganhas patrulhem o campus? Se matarem, se roubarem e se estuprarem, vão bater na porta de quem? Da turma do fumo é que não vai ser, tampouco na do diretório acadêmico - que no meu tempo servia apenas para organizar chopadas, peladas e campeonatos de futebol de botão; isso mudou?
Eu botava lá a PM, tendo antes o cuidado de reunir-me com o comando do batalhão para alertar-lhes de que trata-se de uma área sensível, politizada, embora enviezadamente. Mas nunca diria: se virem um maconheiro, deixem para lá. Em tempo algum pediria à polícia para, nesse caso, deixar de ser polícia.
Mesmo porque, o que me garante que no meio daquela turminha puxando um fumo não estará um traficante? E se fumar maconha é infração prevista em lei, deve ser reprimida. Concorde eu ou não.
O que isso não pode é, por causa de um grupo de baderneiros, gente mancomunada com funcionários ligados a sindicatos, virar situação política. Daqui a pouco, vamos começar a respaldar os idiotas que, dias atrás, invadiram uma transmissão ao vivo da Globo, berrando coisas que ninguém entendeu. Vamos chamar a isso de direito à liberdade de expressão?
Não se pode confundir as coisas e temos de ficar atentos porque tem muita gente disposta a, deliberadamente,  fazê-lo. A invasão dos prédios da USP foi um ato de vandalismo, foi depredação de uma propriedade pública e isso não pode ser permitido, sob qualquer pretexto. Nesses casos, o caminho é a reintegração de posse pedida à Justiça e o envio da força policial para restabelecer o direito legítimo do proprietário. A turma de mascarados, que na indumentária e nos gestos se igualou a bandidos revoltosos de qualquer pernitenciária, sabia que o trajeto a ser seguido foi o descrito acima.
Elegeram até um estudante profissional, desses que jamais são jubilados e têm mais de 10 anos vagando pelo campos, se escorando em conexões políticas espúrias. O camarada tem cara de velho, apesar do jeito pouco higiênico de ripongo. É presidente do CA ou coisa assim. Tinha que estar mais empenhado em protestar contra a violência que vitimou alguns dos seus colegas, contra a insegurança e supostas conexões entre bandidos e guardas particulares. Ou o malandrão se esqueceu que, mesmo caduco, há um Código Penal que prevê detenção para quem é flagrado com drogas?
Não aceito essa turma e, por ter filhos em idade de crescimento, vou orientá-los para que fujam dela. Participei de atos políticos, passeatas, mas nunca protestei em defesa da maconha, do direito de encher a cara na faculdade, de traficar cocaína. Quem ia em cana por esses motivos, sabia por que estava indo e que riscos corria. E como disse Tim Maia, cada qual com seu cada um. Não vou jamais estimular a confusão de conceitos, coisa de ignorantes ou de mal-intencionados.
Meus filhos poderão me chamar de careta, outros que lerem esse artigo me tacharão de reacionários. Não retiro uma única e escassa palavra ou conceito exposto aqui. Quando a gente envelhece é que percebe o ridículo de algumas posturas, de certas posições. Embora eu não subestime a estupidez de ninguém, a tendência do homem é a evolução, sobretudo a das ideias.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

É para ser derrubado

Vi atentamente a cena em que o cinegrafista da Band é atingido por um tiro fatal, disparado por um traficante da Favela do Antares. Embora não possa garantir, tenho a desconfiança que, quem  disparou, o fez de propósito e com uma arma de longo alcance. Não poderia afirmar que foi um rifle com mira, mas não creio que tenha sido um fuzil, que é menos preciso a grandes distâncias. E se o cinegrafista foi atingido por uma arma específica, quem disparou o escolheu como alvo.
E isso é grave, gravíssimo, aliás. É sinal de que o jornalista está sendo colocado no mesmo patamar do policial - o de alvo. Não estranharia. Cinegrafistas, fotógrafos, repórteres e todos os que pretendem cobrir uma guerra são vistos muitas vezes como inimigos, já que registram quase sempre somente um lado. Nesse caso, o dos policiais. Como o aparato de segurança, em tese, está do lado da lei, imagens e relatos costumam ser de acordo com o que as fontes oficiais dizem. Na guerra da informação, os bandidos também saem perdendo.
É um raciocínio enviezado, mas faz sentido. Na cabeça do marginal, ele não oprime a favela. Quem faz isso é o policial, corrupto ou não. Na cabeça do traficante, ele tem até "consciência social" - para usar uma frase cínica tirada do Tropa de Elite I -, ajudando no gás, no remédio, na compra de mês. Claro que tem a contrapartida, como guardar um arsenal, dar abrigo a um foragido, esconder uma carga de drogas. Mas, na cabeça do bandido, essa é uma relação cordial com a "comunidade". Até simbiótica.
A polícia é quem chega dando tapa, distribuindo tiro, humilhando - sempre na visão do traficante e, supostamente, na do morador da favela. E a imprensa que sobe junto não vê nada disso, porque, claro, isso não é feito na frente dela. Daí porque, para o bandido, jornalista passa somente um lado da história, que é o lado do suposto opressor. O malandro é um coitado, uma vítima. Sendo assim, repórter, fotógrafo, cinegrafista é inimigo também.
Não vou nem citar o caso envolvendo Tim Lopes para exemplificar o que estou falando. Há casos nos quais fica clara intenção de matar quem é da imprensa. O cinegrafista argentino Leonardo Henriksen virou alvo de um grupo de soldados, no golpe do Chile. Imagens que não deveriam circular o mundo o colocaram na mira de um fuzil. Não havia engano: quem deu o tiro sabia no que estava atirando.
Outra imagem difícil de esquecer foi a da morte do jornalista americano Bill Stewart, na guerra civil da Nicarágua. Um jovem soldado das tropas de Anastazio Somoza mandou que deitasse no asfalto e disparou-lhe um balaço na cabeça. De longe se pôde ver o corpo vibrando com o impacto do disparo. Ali também a ideia era intimidar, mostrar que a imprensa não era amiga e que, supostamente, assumira  um lado, o dos sandinistas.
As imagens feitas pela Globo, no Complexo do Alemão, ano passado, dos traficantes fugindo feito batatas tontas os humilhou. Mostrou que são um bando, sem estratégia de defesa, desarticulado no ataque e desorganizado no comando. A imprensa, na cabeça deles, os mostrou como uns covardões que só se sustentam porque a força da bala sobre a população desarmada é desproporcionalmete maior.
Talvez a morte do cinegrafista tenha sido uma vingança atrasada. Não afasto a hipótese de que quem tenha atirado nele o tenha visto como um inimigo que carregava uma câmera em vez de uma arma. O bandido, no seu raciocínio maniqueísta e rastaquera, gostaria de passar sua história, dizer que não é tão ruim, que é até bonzinho. Afinal, é um comerciante e, no capitalismo, o que manda é a lei da oferta e da procura. Se ele vende cocaína, crack e maconha, é porque, "na pista", tem sempre alguém a procura. E se não fosse um comércio tão lucrativo, a polícia jamais tentaria abocanhar um quinhão.
É essa polícia que, de alguma forma, dá cobertura ao jornalista, que com ela entra na favela, mas não registra tudo que deve ser registrado. Para o bandido, a imprensa vê o que quer ver; vê o relato oficial, o que interessa ao governador, ao secretário de segurança. Respalda os pontapés, tapas, humilhações e balas perdidas distribuídas pelas forças do estado.
Então, jornalista é alvo também, é "alemão" também. Mas parece que ninguém tinha percebido isso. E na guerra, inimigo é para ser derrubado.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

A volta dos mortos vivos

Demóstenes Torres (DEM-GO) vai pedir o impeachment do governador do DF, Agnelo Queiroz. Se o senador um dia souber da existência desse blog e se der ao trabalho de lê-lo, verá aqui meu conselho: desista, não vai conseguir. E pelas razões que passo a enumerar agora.
A primeira delas está relacionada à imprensa local. Demóstenes verá com muita facilidade que os jornais, estranhamente, não dão coisa alguma sobre o embrulho no qual Agnelo está atado. E quando dão é de forma distorcida, jogando noutra direção as raízes do escândalo. Uma dessas publicações disse que a troca que o governador fez, que movimentou a cúpula da polícia e cujo resultado foi uma razzia de nomes, foi uma questão administrativa. Qualquer pessoa que juntar dois mais dois há de perguntar: ora, por que não fez antes? Se havia politização num lugar-chave, como a Polícia Civil, por que deixou chegar a esse ponto? E por que a politizou?
São perguntas que nem Agnelo, nem sua nova cúpula de segurança, vão responder com firmeza. Será um festival de tergiversação, com as justificativas mais estranhas. Mesmo porque a nova turma da polícia é toda ligada ao ex-governador Joaquim Roriz. Trata-se de um pessoal que conhece completamente os caminhos do governo e a forma de controlá-lo.
Toda essa complacência da imprensa local é muito bem remunerada. Nenhum desses veículos têm coragem ou independência. A administração da dificuldade de Agnelo passará, em breve, por uma mesa de negociações. No começo deste ano, o governador jogou lá embaixo a "taxa de simpatia" aos veículos, o que os deixou revoltados. Está chegando a hora de renegociar esses patamares, sob pena de alguns recados serem passados pela imprensa no formato de incômodas reportagens. Às vésperas de completar um ano, é tempo de reajuste. Que Agnelo vai pagar sem pensar duas vezes.
Mas existe um segundo ponto, que é o decisivo: a Câmara Legislativa. Agnelo tem, sim, 22 dos 24 distritais, mas somente enquanto puder atendê-los. O que se verá, de agora em diante, será um festival de apararelhamento da máquina do GDF. Todas aquelas boas intenções, que seriam sérias se fossem verdadeiras, de reduzir o quadro do governo e qualificá-lo, vai ficar para trás - se é que já não ficou há algum tempo, pois ninguém obtem maioria folgada se não pagar bem direitinho a base de apoio.
Agnelo começou o governo batendo de frente com a Câmara Legislativa. Houve uma revolta de distritais, que de sincera não tinha nada. Queriam vender dificuldade para obter facilidade. Há, inclusive, bons nomes na Casa, mas que não têm coragem de se tornar o chamado ponto fora da curva. Seguem a manada, ainda que isso não lhes renda muita coisa, já que não pleiteiam tantos cargos quanto outros, que têm maior avidez.
Mas tem a turma que apóia qualquer governo, que, é evidente, vai querer ser bem remunerada para dar apoio a Agnelo e impedir que um processo de impeachment viceje. Como as duas deputadas não têm tanta envergadura assim para criticar o governo - Liliane Roriz tem um sobrenome que não a ajuda; Celina Leão, além de ser ligada aos Roriz, foi chefe de gabinete na notória Jaqueline, e há pouco tempo teve de dar explicações sobre isso -, os demais não encontrarão barreiras para cobranças. As duas, aliás, sequer serão ouvidas pelos jornais, que não querem coisas incômodas vindas delas.
Demóstenes tem somente uma chance: assim como aconteceu com José Roberto Arruda, que a imprensa de fora, que não tem qualquer compromisso com Agnelo, comece a denunciá-lo com provas contundentes. A cada dia terá de surgir uma nova informação de que o suposto reformador não é uma figura impulta, tampouco ilibada. Somente esse caminho será capaz de levantar o fio dessa meada. E aí há uma chance de o processo de impeachment avançar, já que aos distritais não interessa o afogamento político, que lhes seria imposto pelo abraço desesperado de Agnelo.
No processo de fritura de Orlando Silva, no Ministério do Esporte, se podia prever que em algum momento o governador seria trazido para dentro da roda. As denúncias existiam, porém não se sabia até então qual a consistência delas. Ano passado, na campanha, não colaram, mas agora têm tudo para fazer um imenso estrago exatamente porque existem provas.
A Veja, quando entrou nesse circuito, não o fez somente por desassombro. Tampouco Orlando aceitou deixar a pasta levando toda a culpa pelas barbaridades no Ministério.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Da condição humana

Nunca subestime a estupidez: ela é sempre maior do que a gente imagina. Escrevo isso porque li, na Folha de hoje, que o jornal foi obrigado a barrar comentários de internautas sobre o câncer do presidente Lula. Tinha neguinho exagerando e deixando de lado a condição humana, para a qual Desmond Tutu nos lembrou quando do assassinato de Muamar Kadafi. Definitivamente, aqueles que o mataram desceram ao mesmo patamar do ex-ditador líbio. E quem xingou ou brincou com a doença do ex-presidente foi tão lá embaixo quando os facínoras mais nojentos.
Algumas coisas não se misturam. Podemos detestar quem quer que seja, até achar que a humanidade não ficará mais pobre sem essa pessoa, mas desejar sua morte ou fazer dela motivo de piada é um absurdo. Claro que não vou lamentar o dia em que Fernandinho Beira-Mar morrer, mas não será por causa disso que vou pregar seu assasinato. Ou, quando ele passar desta para pior (alguém duvida disso?), dar gargalhadas de satisfação, fazer ironias ou algo do gênero. Posso não ser o mais evoluído dos mortais, mas não pretendo jamais me nivelar por baixo.
A doença do ex-presidente pegou muita gente de surpresa, gente que, claro, acreditava que ele estava pavimentando a volta em 2014. Pelo jeitão palanqueiro de Lula, ficava fácil acreditar nessa possibilidade. Mesmo porque não são poucos, no governo, no PT e nas hostes aliadas, que não se acostumaram com o estilo Dilma. Preferem a leniência do antecessor da presidente, que cada vez mais vem sendo provada pelo tanto de escândalos desbaratados. Um ministro a cada 24 dias, em média, convenhamos que é inédito no Brasil e em várias partes do mundo. Exceto por Pedro Novais, que foi defenestrado do Turismo, o restante é herança deixada por Lula.
Mas isso nada tem a ver com o câncer de laringe que o afetou. O ex-presidente vai dispor de todos os recursos possíveis, que não são do alcance do cidadão comum, e não devemos odiá-lo por isso. Devemos, sim, lutar para termos as mesmas possibilidades. A doença não pode entrar no debate da discordância política. Já foi o tempo em que os conflitos de opinião eram resolvidos no risco da faca ou a bala. Já foi? Bem, depende de onde nos encontramos. Mesmo em alguns lugares bem perto do Rio de Janeiro não se aceita o dissenso pacificamente.
Estamos, porém, falando de seres humanos normais e seres humanos normais não se regozijam do sofrimento de ninguém, não se comprazem com a doença alheia, não brincam com a dor do outro. Lula pode não ter sido um exemplo de governante, mas vou me colocar sempre no seu lugar quando o assunto for o câncer de laringe que começou a tratar. Me solidarizo com ele e sua família ainda que, se fosse o contrário, ele jamais saberia pelo que eventualmente eu estaria passando. Só que eu jamais cobraria dele isso pela imensa distância que existe entre nós. Lula é Lula, um ícone da política brasileira e mundial, um sujeito que, gostem ou não, escreveu seu nome na história.
Eu? Quem sou eu? Ninguém. Um cidadão-contribuinte-eleitor que tem imenso orgulho de ser apenas isto.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

A eficiência do grito

Muito se tem falado na reforma ministerial como panaceia para todos os males do governo Dilma. Coloco menos fichas nessa dança das cadeiras, que tem até mês marcado: fevereiro, depois da volta do Congresso. Acho que sairão, sim, alguns dos ministros atuais, como Fernando Haddad e Irini Lopes, porque vão disputar as prefeituras de São Paulo e Vitória, respectivamente; Mário Negromonte, porque perdeu a sustentação da bancada; e Carlos Lupi porque jamais foi figura do agrado da presidente (sem contar que contra ele já se avistam no horizonte as vagas de escândalos no Ministério do Trabalho, que podem engoli-lo antes de o carnaval chegar).
E quanto a Ana de Hollanda (Cultura), Isabella Teixeira (Meio Ambiente) e Tereza Campello (Desenvolvimento Social)? Eu iria com um pouco mais de calma nesse pano verde de apostas, já que tem muita gente chutando com as duas e com as quatro pernas sobre substituição das três. O que vejo é esse movimento marítimo da falta de notícia e do requentamento de velhas suspeitas, todas elas atendendo a alguém ou a algum grupo.
Acostumou-se no Brasil a acharem que governo bom é governo que se propagandeia. Isso se estende a ministros, secretários e todos aqueles que têm a certeza de que a mídia é uma espécie de massa corrida que disfarça as imperfeições da construção. Quanto mais o sujeito aparece, mais se fixa a ideia de que está trabalhando, fazendo algo, correndo atrás. Exemplos disso foram os governos Lula e José Roberto Arruda, no DF, que ganharam imenso espaço - no primeiro caso, pela obviedade de que qualquer coisa que o presidente da República diga deve ser registrado; no segundo, porque havia a complacência bem remunerada dos veículos de comunicação locais.
Venderam a imagem de gestores modernos, atuantes, que vão onde a ação se passa. Várias vezes Lula botou ministro debaixo do braço para defendê-lo das pesadas acusações que a imprensa fazia. Nesse cabo de guerra com jornais e revistas, acabava sempre ganhando, já que era parte do discurso a satanização dos meios de comunicação, responsáveis por uma suposta (e somente por ele enxergada) tentativa de desestabilizá-lo.
Assim, Lula jamais desceu do palanque e deu sempre a impressão de que estava disputando eleição e trabalhando, ao mesmo tempo. Com Arruda deu-se o mesmo fenômeno, inaugurando obras sem qualquer importância, participando de eventos duvidosos, apresentando plano que ou já tinha saído ou ainda custaria muito a deixar o papel. Enquanto não foi arrastado pela Caixa de Pandora, isso funcionou imensamente, a ponto de ele estar diante de duas excelentes hipóteses de futuro político: concorrer à reeleição ou sair como vice na chapa presidencial de José Serra.
Assim, fica para muitos a imagem de que gestor competente e operante é aquele que está sempre em evidência. Claro que discrição demais prejudica e ajuda a turbinar as críticas, mas parte da imprensa ainda não consegue conectar silêncio à eficiência. Está acostumada a histrionismo, ao populismo, ao discurso verborrágico, ao palanque, à frase de efeito.
Uma tradição que vem do grito de independência de Dom Pedro I, ao erguer a espada às margens do Ipiranga e exortar que aqueles que fossem brasileiros o seguissem.