segunda-feira, 27 de junho de 2011

A dama e a presidente

Leio na Folha de S.Paulo de hoje que um produtor convidou Marieta Severo para viver o papel de Dilma Rousseff no cinema. Ficarei surpreso se a grande atriz aceitar um convite tão esdrúxulo, não apenas porque é uma bela mulher - para viver o personagem teria de passar por um downgrade, digamos assim -, como também  tal proposta trata-se de visível oportunismo. Marieta colocaria sua empatia e seu talento a favor de uma visível peça de propaganda, ela que já viveu na tela personagens de envergadura da mãe do cantor/compositor Cazuza de forma brilhante. Aliás, Lucinha Araújo vem sendo solenemente ignorada pelo governo federal em seus esforços de sustentar a Fundação Viva Cazuza, algo que faz com recursos próprios e da iniciativa privada. Por associação, Marieta não poderia se prestar ao papel de "presidenta".
Não é que Dilma esteja proibida de ser retratada nas telas. Só que não agora. A presidente fez pouco ou quase nada e ainda não conseguiu inscrever-se na história do Brasil. Quem sabe daqui a um tempo e quando estiver bem longe do governo.
A mesma esperteza aconteceu com Lula, que virou o filho do Brasil e naufragou nas salas de cinema. Com justíssima razão foi ignorado e somente os muito serviçais acreditaram que o filme do clã Barreto não seria percebido como trabalho de encomenda. A opinião pública, que repudia farsas com estas, deu de costas à produção, que de tão ruim ainda não virou DVD. Ou se virou, não se encontra nas lojas, tamanha a falta de interesse do público consumidor.
Essa carona que alguns espertos pretendem pegar no bom momento do cinema brasileiro é ranço do velho oportunismo do qual a vida nacional não consegue se livrar. Me impressiona como o dinheiro pelo dinheiro fala mais alto. Dificilmente uma produção sobre Dilma não teria apoio oficial; receberia recursos a rodo, com base nas leis de obtenção de verba. Claro: seria um lobby discretíssimo, com todos os doadores se credenciando a obter as graças do Palácio do Planalto.
E como uma produção não é algo rápido, por uma dessas incríveis coincidências ficaria pronta e seria lançada em 2014, época da corrida da presidente à reeleição. Tal como aconteceu com "Lula, o filho do Brasil", que pode não ter sido fundamental, mas ajudou a aplainar os caminhos de Dilma nas urnas.
Não sei dizer se Marieta aceitará ou não o convite. Mesmo porque, quando o assunto é cultura, a ex-cunhada da grande atriz, a ministra Ana de Hollanda, tem protagonizado episódios que vêm merecendo censura de todos os lados. O mais recente foi a subida de seu produtor musicial para as salas do Ministério, algo que muita gente considerou inadequado. Sem contar as questões envolvendo o Ecad, contra o qual a pasta parece não ter qualquer plano concreto para colocar ordem naquela casa.
Marieta é uma atriz consolidada, um grande nome do teatro e do cinema, com passagens fulgurantes pela TV. Mas sempre fica a dúvida se resistirá. O que a gente (ainda) acredita é que a ombridade seja sempre maior que os brilharecos.

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