segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Sons para se ouvir no carro VI

Há muitos anos, nas tardes de sábado, eu ia para a casa de um amigo, o Velório, ouvir um programa de rock que existia na antiga Rádio 98, no Rio de Janeiro. A 98 era herdeira direta da antiga Eldopop, que velhuscos saudosistas como eu até hoje enchem a boca para homenagear. O programa, creio, era das 3 às 4 da tarde e foi nele que ouvi, pela primeira vez, Stone dead forever, um porradão do Motorhead que curto até hoje, 30 anos depois.
Mas o som que ouço agora no carro começou com um susto. Assim: a guitarra fazia dueto com uma voz rouca, cheia de trejeitos e todo o tempo praguejando. Até que a voz desaparecia. Fazia-se um breve silêncio até que BROOOM-UOOOOON-UEMMMMMM-ROOOOOOOM-ZIIIIIIIIUUUUUUU (essa é minha interpretação onomatopeica para as notas gordas que eram tiradas)... e fechava, com o prato e o baixo, para que imediatamente começasse um solo alucinado. As palhetadas eram velocíssimas, os dedos voavam pelo braço da guitarra.
"Porra, Velório, que som é esse?"
"Sei lá, vamos ver se o locutor anuncia".
E anunciou. "Van Halen, Everybody wants some". Caraca, o Van Halen tinha se superado em matéria de peso e esporro. Não preciso nem dizer que, nas semanas seguintes, depois de passar fome no colégio, lá estava eu com minha edição do LP Women and children first, o terceiro da banda. Como comprei uma das primeiras prensagens no Brasil, tive direito a um pôster de David Lee Roth, o cara da voz rouca, numa pose supergay, de joelhos e com as mãos amarradas por correntes a uma grade. O pôster dei para minha irmã, que, evidentemente, o perdeu. (Quanto não deve estar valendo essa edição hoje...)
Voltando ao LP. Ainda hoje não o considero melhor que o Van Halen I, que pode ser considerado, no mínimo, histórico. Women é um bom disco, melhor que o VH II, que decepcionou muita gente, inclusive a mim. Mas, ouvindo-o agora com ouvidos mais apurados, trata-se de um trabalho cheio de erros, só que com o pecado de ser pretensioso. As grosserias que fazem de VH I um clássico, com sua produção raçuda e semi-tosca - algo deliberadamente traçado por Ted Templeman e Don Landee, que já haviam trabalhado com outros megaartistas, como The Doobie Brothers -, nesse Women parecem desleixo. Parecem a necessidade de corrigir rápido um erro, tal como foi VH II.
Têm execelentes faixas, como Everybody wants some, ou Tora, Tora, ou Take your whisley home. Loss control ou Romeo delight também são estupendas, mas o disco abre em marcha lenta com And the craddle will rock. Ainda que a intenção fosse dar um ar de crescendo ao LP, se já começasse com um porradão, quebrava aquela impressão inicial de que se arrastaria por um rock pouco inspirado, como o de abertura.
Mas não é somente isso. Já ali o Van Halen começava a delirar com faixas como Could this be magic?, acústica e que serve somente para que Roth possa mostrar seu conhecimento do cancioneiro popular norte-americano. A partir disso, os discos do VH passam a mostrar algo do gênero, que pode ser até um exercício de bom-humor e criatividade para alguns, mas para muitos - como eu - são apenas desperdício de espaço e de vinil. São músicas que se fossem suprimidas dos LPs não fariam falta alguma.
Em Women, o VH também assume ares de grande banda, agregando elementos que tiraram a graça e a agressividade inicial do quarteto. Isso fica claro na capa e na contracapa, com Eddie Van Halen segurando uma Kramer feita especialmente segundo suas especificações. Para quem passou a sonhar com aquelas Fender Stratocaster mexidas pelo então pouco conhecido John Suhr, que podem ser vistas nos dois primeiros trabalhos, a troca pareceu um sacrilégio. "Onze entre dez" guitarristas queriam uma Fender daquelas, com aquele som que ninguém nem nenhum guitarrista conseguia reproduzir.
Continuo recomendando: Women não é um disco ruim, muito ao contrário. Ele custa a engatar e talvez seja isso que irrite. É um trabalho que, se um marciano chegasse hoje à terra e quisesse conhecer algo do van Halen, poderia não agradar. Infalível continua sendo o VH I. O VH II é controverso. Já Fair warning, Diver down ou 1984 é para quem já não se assusta mais com o Van Halen.
E evitem sempre conhecer a banda já na fase Sammy Hagar. Pode ser antipatia à primeira vista.

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