quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Imagine isso na Copa

Fora de dúvida que um aeroporto ficar 46 horas interditado por causa do acidente envolvendo um super-cargueiro é uma dessas lambanças monumentais. Nos faz, com justa razão, temer sobre o que vem por aí na Copa do Mundo e na Olimpíada, mesmo com os apelos ufanistas passados por uma propaganda de cerveja. Mas, apesar de todo o transtorno - que me atingiu no Rio, a quilômetros de distância de Campinas e sem que eu nada tivesse a ver com o caso -, as soluções que deram para que problemas semelhantes sejam sanados, se de novo acontecerem, beiram a burrice.

O mais fácil deles: comprar um equipamento de salvatagem, cujo kit básico custa cerca de R$ 2,5 milhões. O único que existe no Brasil, e estava em São Carlos, a quilômetros do acidente, foi usado provavelmente pela primeira vez. Pertence à TAM e foi alugado pela Infraero, para posterior ressarcimento pela Centurion Cargo, arrendatária do MD-11 que interditou a pista de Viracopos.

Um equipamento como este não é simplesmente comprado e colocado dentro de um armário. É necessária sua manutenção e, evidentemente, formação da turma de técnicos que vai operá-lo. Turma, não; turmas - para que haja turnos de revezamento. No mínimo, três delas em permanente disponibilidade, composta de seis a dez homens.

Tudo isso custa dinheiro: conservação, formação de pessoal, reciclagem técnica, instalações, transporte. Uma conta que não sairá barata, sobretudo quando se pesa a relação custo-benefício de se comprar um kit desses.

E quantos existem nos Estados Unidos? Quatro. Na Alemanha e na França? Três. Na Inglaterra? Dois. No Japão? Dois. Como se percebe, a solução mais fácil é a mais cara, não adotada pelas nações que abrigam alguns dos principais aeroportos do mundo.

E o que fazem, então, para que uma pista não fique interditada 46 horas, prejudicando voos de outras praças e companhias aéreas que operam na mesma unidade?

A resposta: têm mais de uma pista! Bestial, ó pá!

A solução é de uma cristalina simplicidade. Viracopos, que é um centro de grande porte, não tem uma pista alternativa. A unidade mais próxima dali é Guarulhos, considerados os tamanhos, para o caso de um desvio de operação.

Não que o projeto de Viracopos não preveja a segunda pista. Existe e está no papel há pelo menos 10 anos. Se começarem a fazê-la amanhã, ficará pronta com muito esforço em 2017.

Entenderam por que Heathrow, Narita, Barajas, Charles de Gaulle, Portela de Sacavén, Doha, JFK, a Guardia e outros grandes aeroportos não ficam interditados? (A não ser por razões climáticas).

O aeroporto de Munique, que ao lado do de Frankfurt forma a dupla de maiores da Alemanha, tem três pistas - duas principais, uma auxiliar. Heathrow outras três, assim como o Charles de Gaulle. Pelo custo de se construí-la, utilizá-la e na eventualidade de um acidente de proporções manter o fluxo circulando, conclui-se que é barato.

Mas o Brasil é o país das soluções improvisadas, que geralmente são as mais caras. Todos concordam que a obtenção de um kit de salvatagem para a retirada de aeronaves de grande porte é preciso. Mas, para que ele pudesse ser utilizado em Viracopos, teve de chegar pela rodovia, aumentando ainda mais o tempo de paralisação do complexo. Claro, como levar por via aérea se a única pista estava interditada?

Quando dizem "imagine isso na Copa", não é um temor sem sentido, pessimismo de brasileiro que tem vergonha do próprio país. Ninguém conhece melhor o Brasil do que nós mesmos, da mesma forma que ninguém sabe melhor como funciona a cabeça das nossas autoridades como nós mesmos.

Há quanto tempo se fala nas tragédias das chuvas, todo começo de ano, na Região Serrana do Rio?

Há quanto tempo se escuta que os barcos que viram no Rio Amazonas e seus afluentes matam centenas de pessoas por causa da superlotação?

Há quanto tempo se ouve dizer que a formação do estudante brasileiro é pífia, a ponto de uma auxiliar de enfermagem injetar café com leite na veia de uma paciente e matá-la?

São alguns exemplos trágicos da imensa e constante falta de prudência.

Agora, imagine isso na Copa!


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