segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Um dos meus herois

Leio no Estadão que Tony Iommi está com linfoma, a mesma doença que acometeu a presidente, e que, em estágio inicial, já deu início ao tratamento. A última vez que o vi foi aqui em Brasília, no Nílson Nélson, com o Heaven & Hell. O falecido Ronnie James Dio estava nos vocais. Geezer Butler pareceu  meio passado, mas tocou divinamente. Vinnie Appice começou o show brigando com a caixa e, depois da intervenão de um roadie, mandou brasa com a competência de sempre.
Sou um desenvolvedor de teorias e considero Tony um dos cinco maiores guitarristas do rock - junto com Jimi Hendrix, Jimmy Page, Ritchie Blackmore e Jeff Beck. O que esses cinco influenciaram de gente, de 40 anos para cá, não está no gibi. Tenho imenso respeito por caras como Pete Tonwsend, Keith Richards ou George Harrison, e os acho brilhantes, mas os vejo muito mais jogando para o time do que colocando o brilho a serviço de si mesmos. Aqueles cinco tinham um carisma individual que, por vezes, era maior do que os grupos em que tocavam.
Musicalmente, Tony foi para mim o mais importante. Com o Black Sabbath, criou um gênero que, dentro do chamado heavy metal, foi o que mais rendeu frutos. A quantidade de seguidores do Sabbath, seja nos acordes, seja na temática, é de perder a conta. Ele, porém, continua acima de tudo, tirando do bolso do colete riffs que arrepiam a alma mais insensível.
Foi Tony quem deu início a essa coisa de fazer "música de terror". Claro: se há filme de terror, por que não música? "Tem gente que paga para se assustar", teria dito ele a Ozzy Osbourne na virada do Earth para Black Sabbath (nome tirado de um filme de Boris Karloff). E ninguém contestou. Estava certíssimo, como o futuro se incumbiu de mostrar pouco tempo depois.
Não li a biografia de Tony, The Man in Black, para a qual ele andou fazendo noites de autógrafo. Se chegar aqui ao Brasil, comprarei. Tenho imensa curiosidade em saber a razão pela qual ele sustentou o Sabbath como a um zumbi. Ainda que depois da saída de Ozzy e de Dio tenha contado com músicos de primeira linha (entre eles Ian Gillan, Glenn Hughes, Cozy Powell, Neil Murray, Eric Singer, Tony Martin e Bobby Rondinelli), perdeu aquela magia que havia até Mob Rules. A sequência foi de altos e baixos, embora eu considere que, se tivesse sido uma outra banda de rock, a carreira seria vitoriosíssima.
Mas apresentava-se como Sabbath e aí a porca torce o rabo. Tal como o Deep Purple hoje, que nada tem a ver com aquela banda que fez história nos anos 70, a marca foi levada ao desgaste extremo, por pouco jogando no lixo um patrimônio de fãs e admiradores que esperava um encerramento de carreira mais digno.
Tony lançou três álbuns-solo, todos muito bons. O primeiro é um festival de convidados. O segundo é sobra de estúdio de um grupo natimorto com Glenn Hughes e David Holland - cuja bateria foi apagada e trocada pela de Jimmy Copeland, já que o ex-batera do Trapeze e do Judas Priest se envolveu num caso de pedofilia. E o terceiro é outra parceria com Hughes, adicionada de dois pistoleiros de aluguel - o superestimado Kenny Aronoff (bateria) e o rato de estúdio Bobby Marlette (baixo).
Logo em seguida, Tony desistiu de ir adiante com seu Iommi. A proposta de levar o repertório do Sabbath na fase Dio com o nome Heaven & Hell, e dali reconstruir uma carreira em grupo, era muito boa. A estréia no Radio City Music Hall, coração de Nova York e uma das mais famosas casas de shows do mundo, foi estupenda. O DVD e o CD são impedíveis.
Logo em seguida, a ideia era badalar o segundo trabalho, The Devil You Know, cuja perna brasileira presenciei. Mas Dio é diagnosticado com um câncer agressivo e em estágio avançado. O fim vocês já sabem.
O H&H ainda colocou no mercado o ótimo pacote Live in Wacken, apresentação da banda no maior festival de heavy/hard do mundo, na Alemanha. O show é parte da turnê de divulgação de The Devil You Know.
Ainda que a apresentação seja burocrática, os quatro mostram um entrosamento e uma vontade de tocar juntos que eu já havia presenciado em Brasília, com Dio brincando quase sempre com Tony e se dirigindo simpaticamente aos demais. O ambiente parecia bom, diferente das fofocas que correram depois do lançamento de Live Evil, que fechou a primeira fase do cantor no Sabbath - rolou a conversa de que ele tentou mixar sua voz bem à frente dos demais instrumentos, cuja vingança de Tony foi creditá-lo somente como Ronnie Dio (sem o James) e colocar o pobre Vinnie Appice como músico convidado (em Mob Rules entrada como substituto oficial de Bill Ward).
Tomara seja apenas mais uma fase da dura vida desse músico que, apesar de não ter as pontas de dois dedos da mão direita, criou um estilo inconfundível de tocar e de compor. Um músico que saiu escorraçado do Jethro Tull, quando substituiu Mick Abrahams depois do álbum de estreia, This Was (pode ser visto com Ian Anderson, Glen Cornick e Clive Bunker no Rock'n'Roll Circus que os Rolling Stones transformaram em filme). Um cara que pela primeira vez tocou no centro do palco, colocando o cantor (Ozzy) à sua esquerda, quase na coxia. Um sujeito que chutou esse mesmo Ozzy quando o vocalista puxava o Sabbath para o buraco, devido ao abuso de drogas e álcool. Um guitarrista que não teve medo de pôr Dio nos vocais, no lugar de um integrante considerado insubstituível. Um camarada que errou (na minha opinião) ao prosseguir com o nome de uma lendária banda, apesar das alterações a cada novo disco.
Enfim, um herói da minha geração.

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