sexta-feira, 18 de maio de 2012

O show tem que continuar

Cartaz do show deste sábado, em Birmingham
Vamos falar de música? Vom'bora, mas com uma polemicazinha para animar as coisas. Tal como essa que envolve Bill Ward, baterista original do Black Sabbath, que está fora do disco e dos shows que Tony Iommi, Ozzy Osbourne e Geezer Butler vão fazer - o primeiro é neste sábado, na 02 Academy, em Birmingham, Inglaterra, cidade natal dos quatro.

Ward é um grande baterista? A resposta é: NÃO! É tecnicamente fraco, se comparado a um Ian Paice, um John Bonham, um Ted McKenna e alguns outros contemporâneos seus. Mas assentava-se maravilhosamente bem por causa da sonoridade até então incomum da banda.

Para piorar as coisas, Ward é alcoolatra. Enquanto se tem 20, 30 anos, isso pode parecer engraçado, mas quando se passa dos 40 o corpo começa a cobrar o preço pela vida de excessos. Claro que ele não era apenas beberrão. Inclua aí cocaína e maconha, e você terá o coquetel completo. Ozzy aguentou bem? Mais ou menos. Prova é que ele hoje parece completamente idiotizado ao falar.

(Vi o show dele em Brasília, ano passado. Para um cara que passou o que ele diz ter passado, tem uma forma física invejável. Mas, algumas vezes - talvez pelo calor que fazia no Nilson Nelson -, encostou no praticável onde estava montada a bateria e, fingindo brincar com a galera, descansou alguns segundos. Também li sua biografia. Impressionante a resistência que tem a substâncias tóxicas.)

Quem ouviu e viu o DVD de Reunion, lançado há alguns anos, percebe que Ward está em má forma. Se na juventude não era grande coisa, imagine com o peso da idade nas costas. Dos quatro, apesar de não se submeter a artifícios estéticos (como o cabelo retintamente preto dos outros três), é o que tem a aparência de já ter ultrapassado os 70 anos.

Não consigo destacar um disco em que posso dizer que Bill arrebentou. Para mim, há faixas em que ele se sai muito bem e outras nas quais faz o básico. Era o que a música pedia? Sim e não. O material do Sabbath vive sendo executado por outras bandas e o que faz diferença é justamente o trabalho da bateria. Ouçam, por exemplo, Speak of the Devil, do Ozzy. Certo é que um baterista fenomenal como Tommy Aldridge faz chover, mas outros caras muito bons já passaram pelas bandas dos quatro - pequena lista: Randy Castillo, Deen Castronovo, Bobby Rondinelli, Michael Bordin, Carmine Appice, Jim Copley, Eric Singer, Vinny Appice etc. - e conseguiam melhorar o que já era bom.

Bill: envelhecido e prejudicado pelos anos de excesso
Assim, quando Bill entrava em cena, a impressão que sempre tive era de que não apenas não conseguia seguir o pique dos demais, como ficava evidente que era o músico menos talentoso. Uma limitação que, ironicamente, não se manifesta no excelente When the Bough Breaks, um dos álbuns-solo de Ward, que sabiamente entrega a bateria para se dedicar ao vocal. E se sai muitíssimo bem, num disco sombrio, uma espécie de heavy Pink Floyd.

Então, se eu, que estou de longe, tenho essa impressão, era natural que os três percebessem a mesma coisa. No tiroteio entre Bill e o trio restante, ele se disse ofendido várias vezes pelas decisões tomadas por Tony, Geezer e Ozzy. A mais recente é a de que tocaria somente poucas músicas em algumas e escolhidas apresentações. Esse prêmio de consolação é próprio da camaradagem. Algo do tipo: "O cara não tem mais condições, mas, como é nosso irmão, vamos arranjar um jeito de não sacaneá-lo". Foi, creio, o que fizeram com Ward.

Quem vai levar a bateria (parece) é Tommy Clufetos, que vinha tocando com Ozzy. Por que não Vinny Appice? Pela razão óbvia de que ele é tão associado à imagem de Ronnie James Dio que, se entrasse, o que se veria nos palcos seria um híbrido do Black Sabbath com o Heaven & Hell. E como esses comebacks têm um quê de ridículo, a emenda sairia pior que o soneto.

Clufetos, porém, não vai entrar na banda, tal como Geoff Nichols jamais entrou desde que Tony arrastou o cadáver do Sabbath após as saídas de Ozzy e Dio - foi oficializado somente na época do Seventh Star; depois, voltou para o backstage. Situação ridícula a do músico que toca das coxias. Todos ouvem aquela cama dos teclados, mas não sabem de onde vem.

Assim, o Sabbath redivivo será somente 3/4 da banda original com mais um convidado. Tal como Jason Bonham tocou com o que sobrou do Led Zeppelin, há poucos anos.

Quanto a Bill, quisera que sua saúde o ajudasse a tocar com os demais ou sua voz estivesse em condições para a retomada da carreira-solo onde parou, na década de 90. Não o conheço pessoalmente, mas tudo que li sobre ele o coloca na lista dos caras afáveis, bons de convivência. Basta ver que, quando Tony e Geezer estava rompidos com Ozzy por causa da saída da banda, Ward foi o único que manteve contato com o vocalista. Tanto que no documentário Don't Blame Me, Bill é quem aparece prestando depoimento sobre o cantor e falando do relacionamento fraternal entre eles.

É pena ver que os herois da gente também têm seus maus dias e péssimos finais. Gostaria de ver Ward, apesar de pensar o que penso dele, em plena forma, levando o material clássico do Sabbath. Gostaria que não envelhecessem. Gostaria que os anos de abuso não pesassem sobre o corpo. Mas não dá.

The show must go on, diz o jargão. Time is money, diz outro. E Bill, pelo tanto de tempo que passou na vida artística, os conhece muito bem.
O baterista com um dos seus adereços prediletos - o copo

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