quarta-feira, 9 de maio de 2012

Vamos recomeçar do zero?

Volto ao assunto que envolve a revista Veja.

Acho que algumas coisas têm que ficar bem claras, sobretudo quando, maliciosamente, comparam o caso atual ao de Rupert Murdoch - e tacham até o Roberto Civita de ser o "nosso" Murdoch. A estupidez é uma das faces da má-fé, tal como acontece com essa conexão que tentam fazer com que seja verdadeira.

Não tenho procuração para defender Civita, mas sabe-se (e não é de hoje) que Murdoch usa de meios amorais e imorais para turbinar seus veículos. "Rup The Red" corrompeu, grampeou, chantageou... Não ele pessoalmente, mas fez do crime prática comum dos seus jornais. A quantidade de barbaridades que o News of the World ou o The Sun publicaram, e a quantidade de processos judiciais a que respondem e foram condenados, mostram que a conduta de Murdoch e seus diretores é duvidosa - para dizer o mínimo.

Civita não veste esse figurino. Não que faltem ações judiciais à Abril, mas não se sabe que esteja respondendo a algum processo no qual tenha sido enquadrado nos artigos mais graves do Código Penal. E ainda que estivesse, haveria de se analisar bem a questão para julgar, então, o peso de sua participação num eventual episódio. Não podemos passar a achar as pessoas culpadas até que se lhes prove a inocência.

Tal como querem fazer agora com o chefe de redação da Veja, Policarpo Júnior. Deixo claro: não o conheço; se entrar na sala em que trabalho e não me disserem que é, jamais saberia de quem se trata. Da mesma forma, ele não precisa da minha defesa.

Mas o fato de ter recebido e publicado informações de um vagabundo, de um marginal, não o descredencia nem o nivela por baixo. Já estive na condição de chefiar redações e editorias. Sempre que estava diante de uma boa informação, não tinha dúvidas: consultava o comando da publicação e a direção da casa. Argumentava e contra-argumentava. Uma vez dado o sinal verde, botava na rua.

Como Poliparpo deve ter feito, sempre me perguntei de onde vinham certos dados, números, documentos. Muitas vezes sabia, outras não. E jamais os considerei inválidos se expusessem um esquema, se desmontassem uma fraude, se colocassem a pique uma quadrilha. Atendiam a interesses obscuros? Na maior parte do tempo, sim. Mas, apesar disso, não estarão sendo o interesse e o bem público defendidos de um mal maior?

Disse no post anterior: quem faz parte da roubalheira geralmente é uma fonte excelente. E não há nada melhor para o jornalismo que um ex-amigo ou ex-sócio ressentido. Quem teve o mínimo de vivência numa redação sabe que esse é o jogo. E que informação boa geralmente emerge de caminhos escuros.

A cada dia se constata que Carlinhos Cachoeira estava no rumo de se tornar um dos homens mais poderosos do País. Vejam a lista:

1) tinha um senador no bolso;

2) tinha deputados no bolso;

3) tinha uma grande empreiteira como parceira;

4) tinha informantes na Polícia Federal;

5) tinha informantes na Controladoria-Geral da União;

6) tinha informantes no Tribunal de Contas da União;

7) tinha conexões com o gabinete do governador Marconi Perillo, por meio da ex-chefe de gabinete;

8) contribuía generosamente com campanhas políticas, da esquerda à direita;

9) tinha contatos estreitos com agências reguladoras;

10) tinha pretensões de colocar um ministro no Supremo Tribunal Federal;

11) tinha representantes nos órgãos de segurança e no judiciário...

Por que não teria conexões com a imprensa? Sobretudo, com o mais importante semanário do País? Ou alguém é ingênuo a ponto de acreditar que, para construir o poderoso rol acima, o contato com a Veja não fazia parte do plano de consolidação de objetivos? Derrubar alguém pelas páginas da revista tem o condão de aumentar exponencialmente o cacife de quem conseguiu tal feito.

Interessava a Cachoeira tornar-se intocável.

Pretendem colocar a Veja e seu chefe de sucursal no mesmo patamar de Demóstenes Torres. Com a seguinte diferença: contra o senador, há provas concretas, lúcidas, de que seu mandato estava a serviço não de Goiás, mas de um grupo criminoso que pretendia, entre outras coisas, se apossar do Estado. Há uma fartura de informações que seguem nessa direção.

E quanto à Veja? Há o que de concreto contra ela? Gravações de Cachoeira citando o nome do chefe da Redação? Pouco, pouquíssimo.

Que o bicheiro fez da revista parceira preferencial das suas manobras, se sabe...

Que a utilizava para atingir seus objetivos, também...

Que sabia que tudo aquilo que entregasse seria forte o suficiente para fazer um estrago monumental, nem se discute...

E que veículo de imprensa faria diferente do que fez a Veja?

Que jornal não publicaria imagens de figuras proeminentes do governo e do Legislativo fazendo romaria à suíte de José Dirceu, num hotel em Brasília?

Ninguém jamais disse que a Renata LoPrete tinha algum contato além do jornalístico com Roberto Jefferson, quando o ex-deputado resolveu detonar o escândalo do Mensalão. Não duvidaram da sua idoneidade, não assacaram contra sua moral, não colocaram em xeque sua capacidade. Tampouco ela foi chamada à CPI para dar explicações, como querem fazer com o Policarpo.

Se todo jornalista que tiver entre suas fontes um marginal, e que por conta disso passar a fazer revelações das mais estarrecedoras, for chamado a prestar depoimento, sujeitando-se à mais vil forma de intimidação - vamos mal.

Se quiserem entrar no debate sobre as relações fonte-repórter, mergulharemos numa discussão interminável e estéril.

Se quiserem rever as conexões da imprensa com o submundo do poder, teremos de recomeçar do zero.

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