segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Um passeio pelas horas

Participo de um fórum sobre relógios, assunto que alguns bestamente insistem em chamar de horologia. Que significa mais ou menos "história das horas e seus artefatos". Bonito, mas, no caso do fórum, mais certo seria horofilia, já que todos são amigos e não historiadores. Feita essa introdução, chego ao ponto que quero: quais são as melhores máquinas?
Admito que sou tradicionalista. Salvo raras e honrosas exceções, relógio para mim tem que ser suíço, de marca suíça. Na Alemanha tem coisa de primeiríssima linha, assim como se encontra algo na França e na Itália. Esses países, não por acaso, fazem fronteira com a Suíça e até mordiscam partes culturais da chamada Confederação Helvética. Um pouco mais distante, a Inglaterra tem alguma tradição no ramo, embora boa parte das marcas que hoje existem por lá (Grahan, Bremont, Christopher Ward, CWC) trabalhe com máquinas suíças. E têm seus produtos montados nos Alpes.
Esse negócio está se espalhando, chamando para o clube fabricantes até então insuspeitos - como chineses e russos, embora a história deles nesse setor não seja nova. Outro dia, vi filmetes no You Tube sobre fábricas chinesas e russas que, numa comparação com as suíças, são toscas. Naturalmente que o intuito é mostrar que ainda não chegaram ao estado de arte dos suíços, mas não se deixe impressionar. Há máquinas desses dois países de respeitável qualidade e algumas delas nem tão baratas e populares assim.
Claro que uma fábrica da Rolex, da Patek ou da JLC tem jeito de laboratório de indústria química, onde tudo é limpíssimo e cristalino. Outras unidades são igualmente fabulosas: silenciosas, mais parecem mosteiros. Ali se desenvolve o melhor da mecânica e da joalheria.
Os suíços formam (ou formavam) gente na Technicum, em La Chaux de Fonds, uma espécie de escola superior de relojoaria. Na verdade, um curso técnico em que o aluno aprende a trabalhar numa profissão eminentemente prática. Gosto do conceito de artesanato empregado nessas indústrias em que se valoriza, acima de tudo, o talento do ser humano.
Daí porque alguns exemplares da indústria relojoeira têm preços proibitivos. São obras de arte, independentemente da decoração que apresentam. Levam meses para ficar prontos e passam por rigorosíssimos testes, para se enquadrar a parâmetros mais rigorosos ainda. 
Os japoneses, que são muito bons e têm um setor relojoeiro extremamente competente e avançado, ainda não conseguiram chegar a esse patamar tão elevado. Não se diga que não sejam tradicionais: a questão é que desenvolveram uma imagem de avanço tecnológico que, ao comprador de marcas de linha exclusiva, não interessa. A massificação e o barateamento fez com que os japoneses sejam, curiosamente, menos respeitados nessa área.
Quando revolucionaram o mercado lançando o relógio a quartzo, a indústria suíça sentiu o impacto. Nada poderia ser pior para ela: uma inundação de peças de boa categoria, precisão e baixo custo. Os japoneses ditaram as regras e levaram várias marcas de segunda e terceira linhas europeias, mas respeitadas, à garra. Tais como Universal, Cyma ou Eterna, que permitiam ao cidadão mediano ter um bom relógio no pulso.
Outras, como Omega ou Tissot (que já haviam se associado por causa da má condição financeira de ambas, na década de 50), por pouco não sucumbiram. Houve aquelas que sobreviveram e nunca mais foram as mesmas, como a Longines. Algumas acabaram sendo compradas e experimentaram o renascimento, aderindo à onda do quartzo - como a Heuer-Leonidas, hoje TAG-Heuer, que passou ao controle dos irmãos Ojeh, comandantes de um grupo de investimento que marcou bem sucedida presença até na Fórmula Um, com a McLaren.
Do extremo mecânico ao extremo do quartzo. Os suíços perceberam que não podiam ficar de fora da corrida tecnológica e, aos poucos, foram entrando na nova era. Houve quem aprendesse com os japoneses, mas houve quem tivesse desenvolvido o próprio maquinário, com o objetivo de ganhar da turma de Tóquio na seara que dominava.
Hoje, é comum achar o relógio suíço a quartzo por preços muito superiores aos dos japoneses. Por que? Porque, mesmo na eletrônica, algumas fábricas desenvolveram o estado de arte, que segue na corrente inversa da massificação. Ainda que comprem de fabricantes de máquinas (como ETA, Ronda ou Selitta), no mundo da relojoaria esses exemplares de quartzo são considerados melhores que os do Japão.
Preconceito? Pode ser. Mas é inegável que um relógio suíço vem acompanhado de incontestável procedência, que lhe garante a qualidade. É como dizem: a pior champanha é superior à melhor cava ou ao mais nobre espumante.
Na área mecânica, os suíços reinam absolutos, com alguns invejados alemães. Por isso um relógio automático suíço é tão caro. E mais caro fica se o movimento for fabricado dentro de casa (o chamado in house).
Há marcas que ainda atingem uma valorização provocada, sobretudo, pela política de exclusividade que adotam. E se isso alcançar um estágio ainda mais elevado - acredite: existe -, os preços vão a cifras astronômicas. Nesse caso, o consumidor provavelmente estará pagando por uma peça única ou feita em quantidade tão restrita que se pode considerá-la única.
Assim, se eu puder deixar um conselho, um relógio suíço será sempre uma compra melhor que um japonês, chinês ou russo. Tem maior valor agregado, o que faz toda diferença. E na seara da relojoaria, quantidade jamais é qualidade. Um relógio chinês, por bom e honesto que seja, jamais atingirá o valor de um exemplar mediano suíço.

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