quinta-feira, 27 de outubro de 2011

CQD ou Como Queríamos Demonstrar

Admito que tenho má vontade com governos, qualquer governo. Não consigo dizer que "fulano fez um grande governo", tampouco "beltrano foi um governante que entrará para a história". Mas não sou nenhum anarquista, para os quais "hay gobierno, soy contra". Só que não posse deixar de me surpreender com o governo Dilma. E positivamente, mas não a ponto de elogiá-la.
Esse episódio Orlando Silva mostra que algo mudou. Foi mais um que entrou na dança daqueles alcançados por algum tipo de malfeito. Como ele, outros quatro ministros foram sacados do time pelas mesmas razões, todos herdados de Lula. Tenho a mais firme das certezas de que, se fosse o governo do ex-presidente, ele sairia pelo Brasil batendo bumbo, com o ministro acusado a tiracolo, afirmando que a imprensa golpista e elitista queria dar um tiro de morte no seu governo.
No caso de Orlando, vejo o cenário: visitaria uma obra de um estádio qualquer da Copa, e falando para uma plateia de operários e iletrados, que têm o legítimo direito de admirar Lula, soltaria um destampatório contra os jornalistas. Colocaria o ex-ministro do Esporte debaixo da asa e o defenderia com veemência, afirmando que o acusador não apresentou provas e que foi procurado para dar depoimento a uma revista que não esconde a linha editorial de colisão com o Palácio. Vejo Lula verberando, rosto vermelho, camisa polo, dedo em riste, acusando a imprensa, enquanto, atrás, Orlando olharia no horizonte, embevecido e garantido pela certeza de que conta com a complacência e o entendimento do chefe maior. Estaria salvo.
Mas com Dilma a banda tem tocado diferente. Em momento algum, ela aproveitou (ou criou) uma oportunidade para defender Orlando. Foi prudente, disse que era preciso esperar os fatos. Não atacou nem defendeu Orlando. Deixou-o diante da incômoda situação de ter que se defender sozinho.
Orlando foi à luta, no Congresso, disse o que quis. Os governistas não se empenharam tanto assim; até facilitaram a trajetória de queda do ex-ministro, ao cochilar e deixar a oposição aprovar um convite ao PM que dedurou o ex-homem forte do esporte. Claro que esse corpo mole escondia uma manobra política (era a chance de o PT levar um gordíssimo ministério e escantear o PCdoB para uma pasta de menor visibilidade), mas mesmo os companheiros comunistas viam que o desgaste só aumentava.
Aí, valeu a lei da sobrevivência: entregar a cabeça de Orlando para ficar com uma pasta que terá imenso protagonismo nos próximos meses. E conseguiram emplacar Aldo Rebelo, uma espécie de genérico cuja seriedade jamais foi colocada em dúvida.
Dilma não vem defendendo ninguém que é alcançado por uma denúncia. Não quer dizer que todo o tempo ela tenha agido assim: tem aí o episódio Erenice Guerra para mostrar que a presidente também tem seus escolhidos. Mas dirão que, quando a poderosa caiu no alçapão, Dilma era somente candidata e agora é presidente. Ou seja, naquela época podia e agora não. Não justifica nada, porém...
Quando a Veja torpedeou Orlando, já se podia prever o desfecho. Iria se esvair em sangue até morrer. Foi o que aconteceu, sobretudo depois que o Supremo abriu inquérito para investigar o ex-ministro. Deu o tiro fatal.
Aliás, parabéns para a Veja. Está conseguindo fazer com que o governo evolua em matéria de pouca tolerância com aqueles que são flagrados com a mão na cumbuca. Os ministros foram saídos em boa parte por causa das denúncias que fez. Forçou Dilma a tomar alguma atitude; isolou os herdados de Lula, como se comprovasse a tese de que o governo anterior foi leniente - e que a regra continuaria em vigor porque o ex-presidente assim queria.
Nem por isso gosto mais de Dilma, que é apenas reativa à questão da corrupção. Mas não posso deixar de reconhecer que prefiro os métodos dela aos de Lula.

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