quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

O Estado é mau gestor e tudo te faltará

Claro que o título é uma brincadeira com o preceito bíblico. Mas é  mais pura verdade. Acompanhei o começo da privatização de perto: trabalhava num jornal já extinto, que era visceralmente contra a venda das empresas que pertencem à União. Havia uma razão oculta e cretina por trás da linha editorial, mas isso não vem ao caso. O fato é que quando o governo Fernando Henrique começou a leiloar estatais, ouvi chorrilhos de bobagens. A baboseira começava no Consenso de Washington e ia na direção da "alienação" das nossas riquezas. Como se um dia essas mesmas "riquezas" tivessem pertencido ao brasileiro.
Nesse raciocínio burro, enviezado, ninguém jamais parou para pensar no tamanho do Estado brasileiro. Era dono de tudo e, para manter essa máquina, tinha que arrecadar. Impostos, taxas e contribuições existem exatamente porque esse elefante é pesado, guloso e indolente. Vivemos ainda a primavera das privatizações, que chegam com pelo menos 50 anos de atraso.
Corrigir as distorções de um sistema em que o governo ainda é o pai de todos leva décadas, talvez séculos. Daí porque o Estado cobra tanto e concede pouco. E mesmo aquilo que devolve vem com custos invisíveis. Um estado grande é necessariamente corrupto. Para as coisas andarem e as parcerias entre poder público e entidades privadas saírem do papel, paga-se. Na ponta, o cidadão ressarce o empresário que foi extorquido. No meio do caminho, até mesmo com eleições uma firma particular que tenha interesses públicos tem de contribuir. 
A distorção nas relações é a principal marca do Estado brasileiro. A mão do governo está em ramos dos quais deveria passar longe.
Voltando  no tempo, acompanhei a privatização da Vale, na Bolsa de Valores do Rio. O Centro da cidade virou uma praça de guerra: a polícia teve de partir para cima dos debilóides que faziam oposição à venda da mineradora. Esses mesmo debilóides estão aí, agora no governo. É estranha a marcha da vida: o radical de ontem é o conservador de amanhã. 
A Vale, por conta da privatização, tornou-se uma das maiores mineradoras do planeta. Mas não pertence aos brasileiros! - bradarão os precipitados. Pouco importa: o cidadão não quer ser dono de nada; quer que a ex-estatal contribua, com seus impostos; pague o que é devido e isso volte na forma de saúde, educação, habitação popular, infraestrutura, cidadania enfim.
E transportes? Os coletivos e seus corredores têm de ser privados. Aeroportos, estradas, ferrovias, hidrovias, portos, nada disso deve ficar nas mãos do Estado. Enquanto foi cuidado pelo poder público, pereceu. Pergunte a qualquer motorista se ele prefere pagar pedágios e andar numa estrada bem pavimentada, sinalizada, segura ou se ele não quer pagar tarifas e trafegar numa rodovia precária, esburacada, insegura? O custo de um carro quebrado, seja particular ou um caminhão de entrega, é sempre muito maior do que o gasto com os pedágios. Sem contar que o pedágio não tira a vida de ninguém, como faz um asfalto maltratado ou uma via mal sinalizada.
Eu prefiro pagar para trafegar num aeroporto confortável, que abrigue vários voos ao mesmo tempo num período de alta, como Natal ou Carnaval. As tarifas vão baixar? Se a operação for eficiente, sim. Voo atrasado que não seja por causa de fatores climáticos é prejuízo. Aeroporto que tem dificuldade em despachar e receber aeronaves representa gasto com combustível, com maior número de tripulações, com manutenção, com pessoal de terra. Significa ainda clientes insatisfeitos e descrentes da competência da companhia.
A Vale foi vendida? Ótimo. Veja no que se transformou. Antes era uma empresa pública privatizada por um pequeno grupo, que quando foi removido nem ficou tão triste assim - um dos filhotes está hoje aí e é um dos bilionários brasileiros. As teles foram vendidas? Hoje não existe mais aquela máfia que traficava telefone e que vendia com imenso ágio quem quisesse ter uma linha. O aparelho hoje é barato, o celular está ao alcance de todos. 
As rodovias estão nas mãos de concessionárias? Que maravilha! Experimente rodar pelas estradas paulistas e as compare com as cariocas. Os aeroportos vão passar à inciativa privada? Oremos que não fique um único nas mãos do Estado. Ou alguém está satisfeito com as condições do Galeão, onde até urubu já foi fotografado no saguão? Ou o JK, que tem as dimensões de uma rodoviária?
Falta a Petrobras, que assim não vai ficar refém de injunções partidárias. Ou as ferrovias brasileiras. Ou as hidrelétricas. Vendam tudo e deem ao brasileiro somente o lucro, ele que já vem arcando com o prejuízo há décadas.

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