terça-feira, 27 de março de 2012

Questão de dignidade

Li a coluna de Augusto Nunes, na Veja on line, e dela pude tirar boas observações sobre o episódio envolvendo Demóstenes Torres. O primeiro é o seguinte: no Senado, atualmente, não existe ninguém com envergadura moral para criticar quem quer que seja. O mais angelical dos seus integrantes tem uma pilha de esqueletos no armário e segredos sórdidos a esconder.
Mas faz parte da política o "parece, mas não é". É uma tática, convenhamos, suicida. Quando a casa cai, vem com tudo e geralmente o personagem fica soterrado sob os escombros. Aconteceu isso com Demóstenes.
Naturalmente que ele não vai renunciar ao mandato duramente conquistado com a ajuda de figuras imensamente interessadas em colocá-lo na Câmara alta do Legislativo federal. Mas se tornou um zumbi. Aquela verborragia moralista e moralizadora agora, se proferida, vai queimar-lhe língua e boca. Tornou-se imprópria se dita por alguém que pediu R$ 3 mil a um meliante para pagar o aluguel de um jatinho. Pelo que ganha como senador, Demóstenes não precisava dessa ajudinha de Carlinhos Cachoeira.
ACM Neto, Aécio, Agripino e Demóstenes: oposição alquebrada
O segundo ensinamento que colho é que todos os governistas estão satisfeitíssimos com a derrocada de Demóstenes (parece até título de épico). Têm frouxos de riso, riem à bandeiras despregadas - como diria Nelson Rodrigues. Pouco importa se, no fundo, pensam assim: "Então, a vestal é bandida também?"
Ou seja, não quer dizer-lhes coisa alguma serem nivelados por baixo. Ou melhor, não se incomodam com isso. Eis que surge um par, um semelhante, um equivalente, do outro lado da porteira. A oposição tem suas laranjas podres também.
Que legal. Vejam àquilo que está reduzido o Senado: o time do Curinga contra o do Pinguim. Quando se pensava que havia super-herois, eis que surge uma espécie de quinta coluna, alguém que consegue enodoar os acusadores dos malfeitos do governo. E nem se diga que Demóstenes foi julgado sem direito a ampla defesa. Ninguém renuncia ao comando do DEM na Casa se não tiver perdido as condições de continuar liderando.
Mesmo porque, liderança pressupõe positividade, desassombro e, por que não?, heroísmo. Líderes conduzem massas, comunidades à vitória contra o mal, o opressor. É maniqueísta mas é verdadeiro. Há tempos aprendi que não existe "líder de quadrilha", mas "chefe de quadrilha". Chefe qualquer um é; líder, não.
Não resta qualquer dúvida de que a oposição do DEM, do PSDB e de outros menos votados (literalmente) embute o ressentimento da perda do poder. Não é feita em nome do interesse do país (expressãozinha sem-vergonha e sem valor). De alguma forma está de olho nas urnas e nos cargos que o governo é capaz de prover. Já foi assim com o PT, que agora desfruta a posição de estar por cima na relação.
No caso de Demóstenes, não demora que pedirão abertura de processo no Conselho de Ética querendo a cassação por quebra de decoro parlamentar. É o rito, o padrão. Vai dar em nada, pois trata-se de um jogo com baralho ensebado.
Não faço a menor ideia de quem seja o suplente do senador goiano, mas  ninguém pretende abrir uma tampa na qual poderiam ser tragados Renan, Jucá, Sarney e outros nomes que constantemente surgem no noticiário político-policial. O Senado é um clube. Só cassou Luiz Estevão porque ele quis fazer-se amigo dos caciques sem respeitar a liturgia das relações na Casa. Se há algo que funciona entre os parlamentares é justamente aquele ditado que diz: "antiguidade é posto".
Demóstenes não perderá o mandato, tampouco vai renunciá-lo. Nos dois casos, seria preciso muita dignidade.

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