sexta-feira, 30 de março de 2012

Até que surja algum maluco

Lendo hoje o Globo, fica fácil deduzir que Demóstenes Torres acabou para a política. Mas ainda tenho muitas dúvidas sobre se será cassado. Por mais que digam que o processo que corre no Senado seja político, quem vai fazer sua defesa é o Kakay, inegavelmente um dos advogados mais caros do País. E ninguém é carro assim se não souber dar nó em pingo d'água.

Kakay é um personagem que transita com a maior naturalidade entre os três Poderes. Tem influência no Congresso, no Palácio e no STF. Não há ilegitimidade alguma nisso. É algo que só faz reforçar seu poder de articulação. As conexões que mantém são capazes de virar o jogo.

Demóstenes ganha, mesmo tornando-se um zumbi político? Ganha. Vira um zero à esquerda, mas continua protegido pela imunidade parlamentar. Só poderá ser julgado pelo Supremo, corte na qual seu advogado tem imenso trânsito. Não esqueçamos que Kakay defende também José Dirceu no processo do mensalão.

Volto a dizer que abrir a tampa da panela que cozinha Demóstenes é perigoso para muita gente. Mesmo porque, a essa altura, o senador deve estar articulando numa defesa na qual arrasta vários parlamentares com ele, dentro da casa na qual milita.

É ingenuidade acreditar que somente dois obscuros deputados goianos serão engolidos pela cachoeira de lama que está para despencar. Esses são apenas os mais afoitos, os menos cuidadosos. Têm aqueles que acompanhavam os processos diretamente, tinham ligações, mas não imprimiram suas digitais. No tempo certo virão à luz.

Claramente também a oposição, que já não era nada, foi reduzida ainda mais. Corre risco de desaparecer totalmente depois desse episódio de Demóstenes. Quem agora acreditará no discurso moralista de Álvaro Dias, Agripino Maia, Aécio Neves, Roberto Freire e poucos outros, depois que o senador goiano caiu em desgraça por colocar o mandato a serviço da contravenção?

Por mais que digam que entre eles e Demóstenes haja uma imensa diferença, o discurso da fiscalização dos atos do governo não merece mais crédito.

O pior é que abre a porteira para a base governista fazer todo tipo de barbaridade. Se do outro lado da mesa quem tem o poder de fiscalizar e denunciar caiu em descrédito, ganha o dono da faca e do queijo.

Durante muito tempo, a imprensa, que rasga o canal de esgoto no qual nossos políticos nadam alegremente, ficará ressabiada com aquilo que vier da oposição.

Não basta denunciar; tem que ter moral para denunciar. Não é interessante para ninguém mostrar que, de um lado e de outro, existem bandidos de alta periculosidade.
Demóstenes foi enterrado vivo pela própria ambição
Como existe maluco para tudo, o Clube Militar pode perfeitamente deflagrar uma campanha para o fechamento do Congresso pela absoluta falta de condições morais dos nossos parlamentares. E querem saber? A população apoiará.

Basta alguém galvanizar o sentimento de revolta contra senadores, deputados, vereadores (e, por que não?, presidente, governadores, prefeitos, ministros...) que se corre o risco de um clamor popular pedir a extinção do Legislativo. E terá legitimidade para tanto. Vivemos a plenitude do estado de direito, que inclui sobretudo a liberdade de expressão.

A prova de que, como disse Churchill, a democracia é o pior dos regimes (excetuando-se, naturalmente, todos os outros), é que o Clube Militar reagiu estupidamente às ações que visam trazer à tona casos fundamentais da ditadura. Realizou um ato de defesa do golpe militar. Podem dizer o que quiserem, mas não se pode defender de forma alguma o arbítrio vivido neste país por 21 anos.

Estou do lado daqueles que se sentem afrontados (e não é de hoje) com a insistência dos fardados em "festejar" a supostamente "redentora". Trata-se de uma provocação, de uma infâmia.

Resultado: o pau quebrou no centro do Rio. Da mesma maneira que quiseram fazer o teatrinho em favor da boçalidade, a turma do contra teve direito de ir para a frente do Clube berrar contra a afronta. Para mim tem mais ou menos o mesmo significado da revolta dos cidadãos judeus que se levantaram contra o desfile de neonazistas em Skokie, décadas atrás, no estado americano de Illinois.

Mas, como vivemos numa democracia - que os militares sempre detestaram -, podem elogiar e defender o que quiserem, como Hitler e o fascismo.

Podem até mesmo pedir o fechamento do Congresso.

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